CONHEÇA!

segunda-feira, 13 de agosto de 2018

CONSIDERAÇÕES SOBRE “FAMÍLIA”

Um artigo muito interessante sobre a Família e suas diferentes formações nucleares...


Está sendo celebrada em todo o Brasil, entre os dias 12 e 18 de agosto, a Semana Nacional da Família. Promovido pela Pastoral Familiar e Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e a Família (CEPFV) da CNBB, o evento traz como tema “O Evangelho da Família, alegria para o mundo”, mesmo tema do IX Encontro Mundial das Famílias com o Papa Francisco, que acontecerá na Irlanda entre os dias 26 a 28 de agosto.

A Semana Nacional da Vida e da Família nos faz lembrar que somos Igreja, comunidade de santos e pecadores. Neste momento delicado da história, toda a Igreja do Brasil se une através de oração em prol das famílias em um ato de valorização da dignidade da vida, desde a sua concepção até o declínio natural, assim como Deus o concebeu.

A exortação apostólica Pós-Sinodal do Santo Padre Francisco “Amoris Laetitia”, sobre o amor na família manifesta que a alegria do amor que se vive nas famílias é também o júbilo da Igreja. Apesar dos numerosos sinais de crise no matrimônio - como foi observado pelos Padres sinodais -, "o desejo de família permanece vivo, especialmente entre os jovens, e isso incentiva a Igreja". Como resposta a esse anseio, "o anúncio cristão sobre a família é verdadeiramente uma boa notícia". Reconhecer as famílias como únicas é o caminho e, é de fato, a resposta.

Mas, é preciso compreender a famílias como um núcleo de pessoas que convivem em determinado lugar, durante um lapso de tempo mais ou menos longo e que se acham unidas (ou não) por laços consanguíneos. Ela tem como tarefa primordial o cuidado e a proteção de seus membros, e se encontra dialeticamente articulado com a estrutura social na qual está inserida.


A família como instituição socializadora de seus membros é o espaço de proteção e cuidado onde as pessoas se unem pelo afeto ou por laços de parentesco, independente do arranjo familiar em que se organize. Entende-se enquanto um processo de articulação de diferentes trajetórias de vida, que possuem um caminhar conjunto e a vivência de relações íntimas, um processo que se constrói a partir de várias relações, como classe, gênero, etnia e idade.

Família é um refúgio seguro, lugar de maior confiabilidade e se constitui também não somente como um núcleo, mas como rede de solidariedade, e em algumas ocasiões como estratégias de sobrevivência. Famílias podem ser: nuclear (tradicional); substituta; monoparental; homoafetivas, etc. 

Como a família é a primeira instituição socializadora da criança, é ela que desempenha o papel de organizadora primária da sociabilidade e da sexualidade, bem como dos laços de dependência emocional entre seus membros. É uma instituição social que não pode ser vista como algo estático, definitivo e fechado. É uma construção a partir de critérios e contextos históricos, sociais, econômicos e culturais específicos.

É uma estrutura singular e complexa – cada família é única, ao mesmo tempo que possui as mais variadas formas de organização. Se transformam e se alteram no tempo. Existe nas famílias experiências de não-estabilidade: recomposição, re-casamento e rearranjos internos formando extensas redes sociais. Portanto, é preciso não idealizar/romantizar a família – ela é lócus de proteção, mas também de desigualdade e violência.

Existe também uma sobrecarga das funções parentais na mulher: elemento estabilizador do grupo – é o membro que tem arcado com grande parte das responsabilidades de provedora e socializadora.

No conceito de família temos: família pensada e a família vivida.

No que se refere a “Família Pensada”, temos o modelo que direciona as escolhas e as decisões das pessoas quanto ao que fazer na vida, quanto às expectativas em relação aos membros da família, quanto aos sentimentos em relação aos outros e quanto à imagem de si mesmo. Não conseguir viver o "sonho" (modelo), gera frustração por ser visto como incompetência. Se não estou vivendo o modelo, o errado sou eu.

A sociedade nos oferece um modelo pensado, mas o pensado é também formado no decorrer da vida em família. Há expectativas, crenças, regras, valores, que vão sendo, gradativamente, construídos dentro da cultura familiar. E há também o componente individual na construção da família pensada, pois cada pessoa tem expectativas, crenças e valores próprios; tem a sua história de vida, que a leva a pensar de forma pessoal. Assim, há três vertentes na formação do pensado: o cultural e o social mais amplo, o cultural e o social mais restrito e o individual.

Já o conceito de “Família Vivida”, refere-se aos modos de agir habituais dos membros de uma família. É a família que aparece no agir concreto do cotidiano, que poderá ou não estar de acordo com a família pensada. As soluções que têm que ser tomadas no dia-a-dia nem sempre estão de acordo com o caminho idealizado. Pode aparecer como o caminho indesejado, transitório, provisório. Os modos de relacionar-se com os outros são apreendidos e vivenciados em família e refletem os significados que foram sendo atribuídos, ao longo das gerações, ao outro, ao mundo e à vida.  Os modos de ser habituais, apreendidos nos anos de convívio com a família, fixam-se e são transferidos para outras relações fora dela. O agir cotidiano é irrefletido e nem sempre corresponde ao pensar idealizado.

É importante refletir sobre o vivido, sobre os hábitos que estão cristalizados para que se possa descobrir novas possibilidades de ação e novas formas de ver o mundo, as pessoas e as relações. O vivido e o pensado não ocorrem num vazio, acontecem na interação com os outros, envolvendo emoções, sentimentos. O que pensamos e o que vivemos estão sempre interligados.

Podemos observar que não há uma definição única de família, não há um "modelo ideal". O ideal para uns pode não o ser para outros. Cada família tem sua especificidade e estabelece um código próprio (constituído de normas e regras). Cada indivíduo se apropria deste código e o usa. Cada um tem sua identidade, mas há uma organização interna à família.

Ao se discutir família não se deve pensar apenas no modelo nuclear patriarcal, já que esta vem se modificando e construindo novas relações a partir de transformações vivenciadas pela sociedade. Para Szymanski (2002), as mudanças que acontecem no mundo acabam por influir e afetar a família de uma forma geral e de uma forma particular, a partir da formação, do pertencimento social e da história de cada um destes segmentos.

Atualmente, a família é compreendida não apenas baseada nos laços consanguíneos e de parentesco, mas nas relações de afeto e cuidado. Szymanski (2002) entende família como sendo “uma associação de pessoas que escolhe conviver por razões afetivas e assume um compromisso de cuidado mútuo e, se houver, com crianças e adolescentes”, não levando em conta para isto, a existência de laços consanguíneos ou de parentesco.

Já Kaloustian (2005) retrata que a família é o espaço da garantia da proteção integral e da sobrevivência, independente do arranjo familiar em que se baseie, mas, apesar de entender a importância do cuidado dentro da família, este autor não expõe que esta instituição também pode ser violadora de direitos e protagonista dos conflitos e violências para com os seus.

Em contrapartida, Mioto (2000) discute que, na atual conjuntura, existem diversas formas de organização familiar que se modificam continuamente com o objetivo de satisfazer as necessidades impostas pela sociedade. Segundo esta autora, “o terreno sobre o qual a família se movimenta não é o da estabilidade, mas o do conflito, o da contradição” (2000, p. 219). Ou seja, para ela a família pode ser o espaço do cuidado, mas não se pode esquecer ou deixar de lado que nas relações familiares também existem o conflito e a instabilidade, sejam eles influenciados pela sociedade ou não.

Além de oportunidade de convivência cotidiana e de locus de acolhimento de seus membros, a família também representa o dinamismo das relações sociais, pois, não é apenas uma unidade biológica; é uma construção social que apresenta formas e finalidades diversas em cada tempo histórico, se construindo de diferentes formas e arranjos, de tal maneira que tendemos como mais correto falar categoricamente de famílias, e não de um modelo monolítico contido no termo singular família.

Diante de tantas mudanças no mundo, na sociedade, afetando principalmente a família, começa-se a discutir o conceito de gênero, ou seja, a relação entre homens e mulheres, como estes se relacionam na sociedade. Ao enfocar os novos arranjos familiares, é de suma importância ressaltar que não nos cabe analisar o que é "bom ou ruim" em relação à família nuclear e os novos arranjos familiares, mas sim ressaltar o atual, o real na vida familiar, onde indiferente da maneira que se organizar, os indivíduos são pertencentes a um grupo familiar e este lhe oferece laços afetivos, valores e funções.



Uilson José Gonçalves Araújo

Consultor e Assessor em Políticas Públicas
Assistente Social - CRESS/PR 6862
Consultor e Assessor em Políticas Públicas
Especialista em Gestão das Políticas Sociais
Especialista em Dependência Química
Telefone (41) 9 9977-1576

Referências Bibliográficas

ARIÈS, P. História social da criança e da família. Trad. Dora Flaksman. 2.ed. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1981.

CEVERNY, C. M. O. Família e o ciclo vital: nossa realidade em pesquisa. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1997.

COLLANGE, C. Defina uma família. Trad. Mário Fondelli. Rio de Janeiro: Racco. 1994.

COSTA, Suely Gomes. Proteção social, maternidade transferida e lutas pela saúde reprodutiva. Revista Estudos feministas. V.10, n.2. Florianópolis, 2002.

ENGELS, Friedrich. A origem da família, da propriedade privada e do estado. 10ª edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1985.

KALOUSTIAN, Sílvio Manoug. Família brasileira, a base de tudo. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNICEF, 2005.

LOSACCO, Sílvia. O jovem e o contexto familiar. In: ACOSTA, Ana Rojas; VITALE, Maria Amália Faller (Orgs.). Família: redes, laços e políticas públicas. 3º Ed. São Paulo: Cortez, 2007.

MIOTO, Célia Regina Tamaso. Cuidados sociais dirigidos à família e segmentos sociais vulneráveis. In: Capacitação em serviço social e política social; módulo 4: O trabalho do assistente social e as políticas sociais -Brasília: UNB, Centro de educação Aberta, Continuada a distância, 2000.

PRADO, Danda. O que é família. 2º edição. São Paulo. Editora Brasiliense, 1982.

ROMANELLI, Geraldo. Autoridade e poder na família. In: CARVALHO, Maria do Carmo Brant de (org.). A família contemporânea em debate - São Paulo: EDUC / Cortez, 2003.

SARTI, Cynthia A. Famílias Enredadas. In: ACOSTA, Ana Rojas; VITALE, Maria Amália Faller (Orgs.). Família: redes, laços e políticas públicas. 3º Ed. São Paulo: Cortez, 2007.

SZYMANSKI, Heloísa. Viver em família como experiência de cuidado mútuo: desafios de um mundo de mudança. In: Serviço Social e sociedade. Ano XXIII, nº 71; Cortez, 2002.

ZAMBERLAM, Cristina de Oliveira. Os novos paradigmas da família contemporânea: uma perspectiva interdisciplinar. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.


Nenhum comentário: