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Jesus e os doze
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Eu gostaria de ter uma resposta simples a essa pergunta. Mas,
por enquanto só tenho ideias a respeito. E também não vamos encontrar a
resposta na leitura de nenhum dos subsídios que temos para leitura. Porque o
que queremos saber é o “COMO”, a prática e não a teoria da coisa, não é mesmo?
E é isso que nos angustia na catequese: a PRÁTICA!
Por mais que o magistério da Igreja e os estudiosos nos deem
as "pistas", cabe a nós vivenciar a prática, sabendo que: cada pessoa
faz a experiência do encontro com Jesus de forma diferente. E não dá para
colocarmos todos na mesma "forma" usando a mesma "receita"
como um "modo de fazer" culinário.
Em primeiro lugar precisamos estabelecer aqui o que
entendemos por catequese "QUERIGMÁTICA" e "MISTAGÓGICA". Em
princípio estes "palavrões" (grandes palavras) nos assustam. São
vocábulos novos na nossa prática pastoral. Mas, vamos tentar trazer alguma luz
sobre este assunto.
Catequese querigmática:
Querigma - é o
primeiro anúncio. Palavra originária do grego "kerissein" que quer dizer:
proclamar, gritar, anunciar.
Querigmático é proclamado, gritado, anunciado. O "primeiro
anúncio" da fé cristã é, obviamente, a crença em Jesus Cristo, filho
de Deus, enviado a nós para anunciar o Reino de Deus na força do Espírito
Santo.
O novo Diretório para Catequese, traz em seu capítulo 2, nº
56 e seguintes, uma grande mudança no sentido da Evangelização como
nós conhecemos até agora: Já não se fala em “três etapas distintas”, onde o
anúncio ou querigma, se configurava na primeira etapa, seguida da catequese
para o aprofundamento da fé. Hoje, todo o processo de iniciação precisa ser querigmático
e mistagógico:
(...) É
importante que, precisamente através da catequese, cada pessoa descubra que
vale a pena crer. Dessa forma, ela não mais se limita a um mero momento de
crescimento mais harmonioso da fé, permitindo descobrir sua grandeza e
credibilidade. O anúncio não pode mais ser considerado simplesmente a primeira
etapa da fé, prévia à catequese, mas sim a dimensão constitutiva de cada
momento da catequese. (DpC 57).
Assim sendo, o querigma é ao mesmo tempo um ato de anúncio e o conteúdo mesmo do anúncio, que
revela e faz presente o Evangelho. Isso é a “catequese querigmática”, que leva
o anúncio por todas as etapas da evangelização, amadurecendo o cristão ao longo
de sua caminhada (catequese permanente).
Tratadas as definições, que podem ter trazido muita luz ou complicado
até mais, vamos aos exemplos práticos que temos.
1. O
"querigma" tal como o entendemos, acontece "antes" de
se iniciar o processo de IVC, ou seja, a partir de um "anúncio" sobre
Jesus Cristo, a pessoa é despertada a participar de uma comunidade de fé.
Aí está o "Pré-catecumenato" (1º Tempo da
IVC), o saber que existe uma comunidade de fé e ser acolhido por ela. É preciso
que "alguém" faça isso, seja pelo testemunho de fé, seja pela
experiência familiar. Seria então o papel de um "introdutor", não
necessariamente alguém de "fora", como é o caso das crianças, mas,
alguém da família. Isso é que se acreditou durante muito tempo: que a família
cumpria o papel do querigma trabalhando os primeiros rudimentos da fé com as
crianças e encaminhando-as ao 2º Tempo da IVC, que é o "Catecumenato"
ou a "catequese", tempo mais longo conforme o RICA.
Qual é a
nossa experiência?
Frequentemente, ouvimos testemunhos "injuriados" de
alguns catequistas reclamando que as crianças chegam à catequese sem saber
rezar nenhuma das fórmulas de oração da Igreja, sem ter lido a Bíblia, sem
saber o sinal da cruz, sem ter frequentado as celebrações, etc, etc. O que
faltou aí? Foi o "anúncio" ou foi a falta de seguimento evangélico
por parte da família, catequizada lá atrás? Estas crianças acreditam em Deus?
Estas crianças fizeram o "encontro" verdadeiro com Jesus, como a
Samaritana no poço? Evidentemente temos que analisar isso do ponto de vista da
idade e compreensão de uma criança.
O fato é que temos que considerar que a maioria das nossas
crianças está ali por conta de um "dever" social e cultural. Elas
precisam de um "primeiro anúncio" e até de um "segundo primeiro
anúncio"! (DOC 107, n.154).
Então essa é a parte QUERIGMÁTICA da nossa catequese:
apresentar Jesus uma segunda vez (ou primeira mesmo!), e apresentar Jesus
sempre e a cada vez que se falar dele, de maneira que isso faça "arder os
corações". Tendo em mente que essa pessoinha vai continuar, pela vida
afora, retornando a este anúncio principal. As experiências de encontro vão amadurecer,
conforme amadurece o indivíduo.
Aí está a razão pela qual nossa catequese precisa ser querigmática: não dá mais para
considerar que a família proporcionou testemunho suficiente para que cada um
encontrasse "Jesus de Nazaré, Filho único do Pai" (CT, n.5), e viesse
à Igreja para a catequese "sedento" daquela "água viva"
apresentada por Jesus à Samaritana.
Como trabalhar este querigma com nossos catequizandos e com
adultos não suficientemente evangelizados? Esta é uma resposta ou caminho que temos
que buscar ao longo do processo.
O novo diretório nos dá as pistas:
Dessa centralidade
do querigma para o anúncio, derivam alguns esclarecimentos também para a
catequese: que “exprima o amor salvífico de Deus como prévio à obrigação
moral e religiosa, que não imponha a verdade mas faça apelo à liberdade, que
seja pautado pela alegria, pelo estímulo, pela vitalidade e por uma
integralidade harmoniosa que não reduza a pregação a poucas doutrinas, por
vezes mais filosóficas que evangélicas” (EG, n. 165). Os elementos que a
catequese como eco de querigma é convidada a valorizar são: o caráter da
proposta; a qualidade narrativa, afetiva e existencial; a dimensão de
testemunho da fé; a atitude relacional; a ênfase salvífica. Com efeito, tudo
isso interroga a própria Igreja, chamada primeiramente a redescobrir o
Evangelho que anuncia: o novo anúncio do Evangelho pede à Igreja uma renovada escuta
do Evangelho, junto com seus interlocutores. (DpC 59).
Segundo o documento, não se pode deixar de lado também, que o querigma tem uma dimensão social. Como a pregação de Jesus tinha. A catequese precisa mostrar esta visão de mundo, da justiça, da vida social com a realização de sinais concretos. Por esta razão, a catequese não é só o segundo momento onde se traz luz ao conhecimento da fé e sim um anúncio de fé que não é outra coisa senão se relacionar com todas as dimensões da vida humana (DpC 60).
Catequese
mistagógica:
Vamos primeiro às definições clássicas: Mistagogia é o
que diz respeito aos mistérios do sagrado. Aquilo que traz o significado, uma introdução.
Mist+agogia = mistério + introdução.
Em um certo sentido é o amadurecimento que envolve todo o ser
na experiência com o que é santo, objeto de fé e suas relações com o outro. O
ser humano traz uma natural necessidade em si mesmo que aponta para o sentido
de si mesmo fora dele, e para percorrer este espaço é necessária esta
compreensão mistagógica, ou seja, ele precisa ser "conduzido" por um
agente mistagogo. Nisso temos que, é na liturgia e nas celebrações que nos “conduzimos”
ao mistério.
A catequese de iniciação à vida cristã está orientada para a celebração
litúrgica. Por isso, são necessárias tanto uma catequese que prepara para os
sacramentos, quanto uma catequese mistagógica que favoreça uma
compreensão e uma experiência mais profunda da liturgia. (DpC 74).
O novo Diretório para a catequese (2020), relembra o
documento Sacramentum Caritatis (64) que cita três elementos essenciais
de um itinerário mistagógico, que tem por base a estrutura fundamental da
experiência cristã:
a) A
interpretação dos ritos à luz dos eventos da salvação, em conformidade com a
Tradição da Igreja, relendo os mistérios da vida de Jesus, particularmente seu
mistério pascal, em relação a todo o percurso do Antigo Testamento;
b) A introdução
ao sentido dos sinais litúrgicos, de modo que a catequese mistagógica desperte
e eduque a sensibilidade dos fiéis à linguagem dos sinais e dos gestos que,
unidos à palavra, constituem o rito;
c) a
apresentação do significado dos ritos para a vida cristã em todas as suas
dimensões, para evidenciar o elo entre a liturgia e a responsabilidade
missionária dos fiéis, além de fazer crescer a consciência de que a existência
dos fiéis é gradualmente transformada pelos mistérios celebrados. (SCa 64).
E o DpC (2020, 98) alerta neste mesmo parágrafo, que a dimensão mistagógica da catequese não se
reduz somente ao aprofundamento da iniciação cristã após ter recebido os
sacramentos, (4ª Etapa do processo catecumenal) mas, envolve também sua
inserção na liturgia dominical e nas festas do ano litúrgico, com as quais a
Igreja já nutre os catecúmenos e as crianças batizadas bem antes de poderem
receber a Eucaristia ou antes que tenham acesso a uma catequese orgânica e
estruturada.
Vistas as definições, vamos pensar nas práticas que temos!
2. Quem é aqui o agente
"mistagogo" que conduz a pessoa ao "mistério" da fé?
Ideal que tivesse sido a família e nós só tivéssemos que aprofundar este
mistério com conhecimentos bíblicos e doutrinários.
Para no Diretório para a Catequese (2020, nº 97), o caminho
formativo do cristão, começou nas Catequeses mistagógicas dos Padres da Igreja,
com um caráter experiencial, sem negligenciar a inteligência da fé. O encontro
vivo e persuasivo com Cristo era anunciado por testemunhas autênticas, e era
determinante. Portanto, aquele que introduz aos mistérios é, antes de tudo,
uma testemunha. Esse encontro tem sua fonte e seu ápice na celebração da Eucaristia
e se aprofunda na catequese. Quem conduz ao “mistério” é alguém que já teve sem
encontro pessoal com Cristo e é profundamente envolvido nos mistérios da fé, a ponto do seu testemunho contagiar o outro.
Mas, nós nos deparamos aqui com uma experiência prática:
Qual é a nossa
experiência?
A enorme e quase insuperável dificuldade em levar nossos
catequizandos às celebrações litúrgicas, que nada mais são, do que o próprio
"mistério da fé". Toda a celebração da missa é inteiramente
mistagógica, simbólica, orante. E as famílias passam longe dela. Assim, que
experiência de "mistério" se passa aos filhos? NENHUMA!
E o fato é que crianças não vão a lugar algum sem os pais ou
o consentimento destes. Aí, entende-se que a "mistagogia" da nossa
catequese, PRECISA ser estendida aos adultos com quem as crianças convivem.
Mesmo porque o aprofundamento espiritual, a abertura ao transcendente, carece
de uma maturidade que as crianças ainda não têm. Mas, elas aprendem por testemunho
de experiências, elas se contagiam pela beleza do mistério e estão mais do que
abertas a aprender coisas novas.
Como trabalhar esta mistagogia com nossos catequizandos e com
adultos não suficientemente evangelizados? Esta, também, é uma resposta ou caminho
que vamos buscar ao longo do processo. Sem esquecer que a Mistagogia é antes de
tudo, vivencial e testemunhal.
Ângela Rocha
angprr@gmail.com
CATEQUISTAS EM FORMAÇÃO
FONTES DE REFERÊNCIA:
CNBB. DIRETÓRIO NACIONAL DE CATEQUESE – DNC.
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. Brasília: CNBB, 2006.
PONTIFÍCIO CONSELHO PARA A PROMOÇÃO DA
NOVA EVANGELIZAÇÃO. Diretório catequético. Vaticano: 2020. Documentos da
Igreja nº 61, CNBB: Brasília, 2020.
CONGREGAÇÃO PARA O CULTO DIVINO. Ritual da Iniciação Cristã de
Adultos - RICA. São Paulo: Paulinas 2003.