Um artigo muito interessante sobre a Família e suas diferentes formações nucleares...
Está
sendo celebrada em todo o Brasil, entre os dias 12 e 18 de agosto, a Semana Nacional da Família. Promovido
pela Pastoral Familiar e Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e a Família
(CEPFV) da CNBB, o evento traz como tema “O
Evangelho da Família, alegria para o mundo”, mesmo tema do IX Encontro
Mundial das Famílias com o Papa Francisco, que acontecerá na Irlanda entre os
dias 26 a 28 de agosto.
A
Semana Nacional da Vida e da Família nos faz lembrar que somos Igreja,
comunidade de santos e pecadores. Neste momento delicado da história, toda a
Igreja do Brasil se une através de oração em prol das famílias em um ato de
valorização da dignidade da vida, desde a sua concepção até o declínio natural,
assim como Deus o concebeu.
A
exortação apostólica Pós-Sinodal do Santo Padre Francisco “Amoris Laetitia”, sobre o amor na família manifesta que a alegria
do amor que se vive nas famílias é também o júbilo da Igreja. Apesar dos
numerosos sinais de crise no matrimônio - como foi observado pelos Padres
sinodais -, "o desejo de
família permanece vivo, especialmente entre os jovens, e isso incentiva a
Igreja". Como resposta a esse anseio, "o anúncio cristão sobre a família é
verdadeiramente uma boa notícia". Reconhecer as famílias como
únicas é o caminho e, é de fato, a resposta.
Mas,
é preciso compreender a famílias como um núcleo de pessoas que convivem em
determinado lugar, durante um lapso de tempo mais ou menos longo e que se acham
unidas (ou não) por laços consanguíneos. Ela tem como tarefa primordial o
cuidado e a proteção de seus membros, e se encontra dialeticamente articulado
com a estrutura social na qual está inserida.
A
família como instituição socializadora de seus membros é o espaço de proteção e
cuidado onde as pessoas se unem pelo afeto ou por laços de parentesco,
independente do arranjo familiar em que se organize. Entende-se enquanto
um processo de articulação de diferentes trajetórias de vida, que possuem um
caminhar conjunto e a vivência de relações íntimas, um processo que se constrói
a partir de várias relações, como classe, gênero, etnia e idade.
Família
é um refúgio seguro, lugar de maior confiabilidade e se constitui também não
somente como um núcleo, mas como rede de solidariedade, e em algumas ocasiões
como estratégias de sobrevivência. Famílias podem ser: nuclear (tradicional);
substituta; monoparental; homoafetivas, etc.
Como
a família é a primeira instituição socializadora da criança, é ela que
desempenha o papel de organizadora primária da sociabilidade e da sexualidade,
bem como dos laços de dependência emocional entre seus membros. É uma
instituição social que não pode ser vista como algo estático, definitivo e
fechado. É uma construção a partir de critérios e contextos históricos,
sociais, econômicos e culturais específicos.
É
uma estrutura singular e complexa – cada família é única, ao mesmo tempo que
possui as mais variadas formas de organização. Se transformam e se alteram no
tempo. Existe nas famílias experiências de não-estabilidade: recomposição, re-casamento
e rearranjos internos formando extensas redes sociais. Portanto, é preciso não
idealizar/romantizar a família – ela é lócus de proteção, mas também de
desigualdade e violência.
Existe
também uma sobrecarga das funções parentais na mulher: elemento estabilizador
do grupo – é o membro que tem arcado com grande parte das responsabilidades de
provedora e socializadora.
No conceito de família temos:
família pensada e a família vivida.
No
que se refere a “Família Pensada”,
temos o modelo que direciona as escolhas e as decisões das pessoas quanto ao
que fazer na vida, quanto às expectativas em relação aos membros da família,
quanto aos sentimentos em relação aos outros e quanto à imagem de si mesmo. Não
conseguir viver o "sonho" (modelo), gera frustração por ser visto
como incompetência. Se não estou vivendo o modelo, o errado sou eu.
A
sociedade nos oferece um modelo pensado, mas o pensado é também formado no
decorrer da vida em família. Há expectativas, crenças, regras, valores, que vão
sendo, gradativamente, construídos dentro da cultura familiar. E há também o
componente individual na construção da família pensada, pois cada pessoa tem
expectativas, crenças e valores próprios; tem a sua história de vida, que a
leva a pensar de forma pessoal. Assim, há três vertentes na formação do
pensado: o cultural e o social mais amplo, o cultural e o social mais restrito
e o individual.
Já o conceito de “Família Vivida”, refere-se aos modos de agir habituais dos membros de uma
família. É a família que aparece no agir concreto do cotidiano, que poderá ou
não estar de acordo com a família pensada. As soluções que têm que ser tomadas
no dia-a-dia nem sempre estão de acordo com o caminho idealizado. Pode aparecer
como o caminho indesejado, transitório, provisório. Os modos de relacionar-se
com os outros são apreendidos e vivenciados em família e refletem os
significados que foram sendo atribuídos, ao longo das gerações, ao outro, ao
mundo e à vida. Os modos de ser
habituais, apreendidos nos anos de convívio com a família, fixam-se e são
transferidos para outras relações fora dela. O agir cotidiano é irrefletido e
nem sempre corresponde ao pensar idealizado.
É
importante refletir sobre o vivido, sobre os hábitos que estão cristalizados
para que se possa descobrir novas possibilidades de ação e novas formas de ver
o mundo, as pessoas e as relações. O vivido e o pensado não ocorrem num vazio,
acontecem na interação com os outros, envolvendo emoções, sentimentos. O que
pensamos e o que vivemos estão sempre interligados.
Podemos
observar que não há uma definição única de família, não há um "modelo
ideal". O ideal para uns pode não o ser para outros. Cada família tem sua
especificidade e estabelece um código próprio (constituído de normas e regras).
Cada indivíduo se apropria deste código e o usa. Cada um tem sua identidade,
mas há uma organização interna à família.
Ao
se discutir família não se deve pensar apenas no modelo nuclear patriarcal, já
que esta vem se modificando e construindo novas relações a partir de
transformações vivenciadas pela sociedade. Para Szymanski (2002), as mudanças
que acontecem no mundo acabam por influir e afetar a família de uma forma geral
e de uma forma particular, a partir da formação, do pertencimento social e da
história de cada um destes segmentos.
Atualmente,
a família é compreendida não apenas baseada nos laços consanguíneos e de
parentesco, mas nas relações de afeto e cuidado. Szymanski (2002) entende
família como sendo “uma associação de
pessoas que escolhe conviver por razões afetivas e assume um compromisso de
cuidado mútuo e, se houver, com crianças e adolescentes”, não levando em
conta para isto, a existência de laços consanguíneos ou de parentesco.
Já
Kaloustian (2005) retrata que a família é o espaço da garantia da proteção
integral e da sobrevivência, independente do arranjo familiar em que se baseie,
mas, apesar de entender a importância do cuidado dentro da família, este autor
não expõe que esta instituição também pode ser violadora de direitos e
protagonista dos conflitos e violências para com os seus.
Em
contrapartida, Mioto (2000) discute que, na atual conjuntura, existem diversas
formas de organização familiar que se modificam continuamente com o objetivo de
satisfazer as necessidades impostas pela sociedade. Segundo esta autora, “o terreno sobre o qual a família se
movimenta não é o da estabilidade, mas o do conflito, o da contradição”
(2000, p. 219). Ou seja, para ela a família pode ser o espaço do cuidado, mas
não se pode esquecer ou deixar de lado que nas relações familiares também
existem o conflito e a instabilidade, sejam eles influenciados pela sociedade
ou não.
Além
de oportunidade de convivência cotidiana e de locus de acolhimento de
seus membros, a família também representa o dinamismo das relações sociais,
pois, não é apenas uma unidade biológica; é uma construção social que apresenta
formas e finalidades diversas em cada tempo histórico, se construindo de
diferentes formas e arranjos, de tal maneira que tendemos como mais correto
falar categoricamente de famílias, e não de um modelo monolítico contido
no termo singular família.
Diante
de tantas mudanças no mundo, na sociedade, afetando principalmente a família,
começa-se a discutir o conceito de gênero, ou seja, a relação entre homens e
mulheres, como estes se relacionam na sociedade. Ao enfocar os novos
arranjos familiares, é de suma importância ressaltar que não nos cabe analisar
o que é "bom ou ruim" em relação à família nuclear e os novos
arranjos familiares, mas sim ressaltar o atual, o real na vida familiar, onde
indiferente da maneira que se organizar, os indivíduos são pertencentes a um
grupo familiar e este lhe oferece laços afetivos, valores e funções.
Uilson José Gonçalves Araújo
Consultor e Assessor em
Políticas Públicas
Assistente Social -
CRESS/PR 6862
Consultor e Assessor em
Políticas Públicas
Especialista em Gestão
das Políticas Sociais
Especialista em
Dependência Química
Telefone (41) 9
9977-1576
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