3º. Domingo do Tempo Pascal
Os
discípulos de Emaús voltaram para a comunidade e contaram à experiência que
tiveram no caminho. Aqueles que tiveram o coração abrasado pela Palavra e que
reconheceram o Senhor no partir do Pão estavam tão maravilhados, que não podiam
deixar de contar aos seus amigos sua experiência. A Igreja faz isso há séculos:
conta a história do passado, transmite o seu legado marcado pela experiência de
fé de homens e mulheres. Mais do que isso: faz a memória do passado, atualiza a
história da salvação, a presença do Cristo Ressuscitado.
Porém,
o anúncio dos discípulos não foi suficiente. Mesmo a aparição do próprio Cristo
não tirou todas as dúvidas do coração da comunidade reunida. O texto do
Evangelho nos diz que estavam tão alegres que ainda não foram capazes de
acreditar no que viam. No dizer popular: “era bom demais pra ser verdade!”
Jesus deseja dissipar o medo, mas ainda encontra discípulos vacilantes, que
tardam em acreditar.
Mesmo diante dos sinais da vitória do Senhor, somos ainda
tantas vezes tardos em crer.
A
aparição de Jesus tem um aspecto pedagógico importante. O Senhor insiste sobre
sua presença real: os discípulos podem o tocar e verificar que ele tem carne e
osso, que pode comer peixe assado. Portanto, não é uma aparição fantasmagórica.
Esta
insistência de Jesus mostra a continuidade entre o Ressuscitado e o Jesus
humano. A ressurreição é uma nova realidade (Jesus não está condicionado ao
tempo e ao espaço), mas o Ressuscitado é o mesmo Jesus que comia, bebia e
conversava com sua comunidade de discípulos, o mesmo que morreu na cruz. Por
isso, traz nas mãos e pés as marcas da crucifixão. Os pés surrados que calçavam
rudes sandálias e que o levaram pelas estradas empoeiradas da Palestina. As
mãos que tanto acolheram e mostraram o amor. Mãos e pés agora feridos por
chagas estão presentes no corpo do Ressuscitado. Também nossas mãos deveriam
ter as marcas do amor, e nossos pés os instrumentos dos passos de entrega.
A
Páscoa é “junção” da vida, morte e ressurreição de Jesus. Este é o anúncio
querigmático dos apóstolos: “Este Jesus que viveu entre nós, foi por nós
condenado e morto, ressuscitou, está vivo!” A Igreja iria proclamar a
totalidade do mistério. Seria um erro enfatizar apenas uma destas duas etapas
da vida do Cristo. Por um lado, os discípulos poderiam ficar com saudade do
Jesus que vivia com eles (em um dos relatos, Jesus pede que Maria Madalena não
o detenha no seu retorno ao Pai). Por outro, poderiam ficar com a felicidade da
ressurreição e esquecer-se de todas as ações e palavras de Jesus de Nazaré.
Hoje se corre o risco de uma visão unilateral sobre Jesus. Muitos têm apenas o
Cristo da Glória e vivem uma fé verticalista ou que se limita a uma experiência
religiosa sem consequências na vida. Outros têm Jesus como um mestre, mas
perderam a dimensão da fé naquele que venceu a morte e está conosco presente
até o fim dos tempos.
Sem
isolar alguma dimensão de Cristo, acreditamos que a vida de Deus encarnado se
dá no cotidiano, na nossa inserção no mundo e no enfrentamento das cruzes do
dia a dia. Por outro lado, temos a certeza de que a vida com suas contingências
será superada pela vida nova oferecido pelo Senhor ressuscitado. Mas somente
chegaremos à glória pela cruz. Assim, não existe vida e morte sem ressurreição,
como não existe ressurreição sem a nossa história. A Palavra nos convida a
viver a totalidade do mistério cristão, oferecendo nossa vida, enfrentando as
lágrimas da existência, enquanto esperamos a vitória de toda dor e sofrimento.
Diante
do mistério da cruz e ressurreição, não podemos ficar de braços cruzados. No
final do discurso de Pedro, há um convite à conversão. A segunda leitura nos
convida a romper com o pecado. Jesus, o Cristo, convida-nos a não termos medo.
Que o Tempo da Páscoa nos traga vida nova de ressuscitados. Que vençamos as
mortes diárias, que enchamos o mundo com a Ressurreição, com a vida de Deus.
Pe Roberto Nentwig
"Basta-te a minha graça, porque é na fraqueza
que se revela totalmente a minha força!"
(2Cor 12,9)
(2Cor 12,9)
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