Estamos entrando na última semana do mês que dedicamos à
oração e à animação missionária. Neste domingo, celebramos o Dia Mundial de
Oração pelas Missões. O Papa Francisco nos convida, citando os Apóstolos da
primeira hora, a não calar aquilo que vimos e ouvimos (cf. At 4,20). Trata-se
daquilo que vimos e ouvimos nestes quase dois anos de pandemia, de genocídio,
de faturamento em cima da tragédia, de negociatas obscenas sem o mínimo de
empatia e compaixão, mas também de gestos de doação sem medida, de avanço
rápido na busca de soluções, de uma capacidade inaudita de resiliência.
É o desejo insaciável de plenitude, de bem viver e conviver
que faz com que a pessoa humana se coloque a caminho. Apagar este desejo, ou
substituí-lo pela rasteira satisfação de uma segurança feita sob medida para os
fortes, equivale a começar a morrer. O ser humano só fica sentado à beira da
estrada e condena quem é diferente quando ainda não alcançou sua própria
maturidade, ou quando teve roubada a sua dignidade. Só quem ousa caminhar para
além do presente é capaz de recusar uma vida sustentada por algumas migalhas.
O desejo mobilizador, criativo e emancipador é também o lugar
do encontro com Deus. Quem busca Deus fora da insaciável sede de plenitude e de
convivência inclusiva e solidária acaba fabricando ídolos que só fazem
amedrontar os viventes e devorar vidas. É Deus quem nos fez sonhadores,
misturando ao pó da terra o sopro divino. E é nessa abertura radical que nada
pode preencher que ele costuma vir ao nosso encontro, acolhendo-a não como
sinal de nossos limites, mas como expressão do infinito que nos habita. É
também do adorável fundo desta condição de criaturas desejantes que brota a
verdadeira oração.
É na oração que revelamos nossos verdadeiros e mais profundos
desejos. Então, o que é que andamos pedindo a Deus? Dirigimo-nos a Deus como se
ele fosse um capitão pronto a eliminar, em nosso nome, as pessoas e grupos que
não nos agradam ou sentimos como ameaça? Confiamos a ele a frágil economia e a
duvidosa moral da nossa família e imploramos que dê segurança às nossas
poupanças e propriedades? Talvez cheguemos até a pedir paz, segurança e sucesso
à nossa Igreja na concorrência com as demais denominações, que tratamos como
concorrentes…
Como são pobres e medíocres estes desejos! Não passam de
necessidades geradas no ventre do medo. Por isso, quando se trata de oração,
não é suficiente pedir com insistência: é preciso desejar e pedir com ousadia e
corretamente grandes coisas. Venha a nós o vosso Reino! Seja feita a vossa
vontade! Democracia radical e respeito aos pobres… Bartimeu, que pede esmolas à
margem do caminho, começa pedindo compaixão àquele que carrega nas próprias
entranhas as esperanças dos pequenos. Antes de manifestar propriamente um
desejo, o filho de Timeu expressa sua própria condição de dor e alienação.
Apesar da contrariedade dos que o circundam e seguem, Jesus
para e se dirige ao cego e mendigo que implora: “O que você quer que eu faça
por você?” Encorajado pelos discípulos, Bartimeu balbucia um pedido que vem do
fundo da condição humana, que espanta todos os medos e exorciza todas as limitações:
“Mestre, eu quero ver de novo!” Neste pedido, aquele homem cego e
mendigo resume todas as suas necessidades e desejos: ver claramente as coisas,
avaliar com retidão os acontecimentos, vislumbrar o Reino de Deus chegando como
graça, tomar decisões políticas responsáveis à luz da razão ética e não dos
medos e ódios…
No mesmo conjunto narrativo, um jovem rico havia voltado
atrás, entristecido, porque era refém dos próprios bens (cf. Mc 10,17-22), e
João e Tiago haviam expressado seus sonhos de poder. Mas o cego se livra do
único meio de sobrevivência que possui e se aproxima de Jesus. E é essa fé
ativa e dinâmica que abre seus olhos. “Pode ir, a sua fé curou você!” E
ele não volta para casa ou para a caserna, mas põe-se a seguir Jesus. Mostra-se
mais livre que o jovem rico, que voltou atrás desiludido, e mais lúcido que
João e Tiago, que desejam os primeiros lugares. E ele jamais calou aquilo que
experimentou, viu e ouviu.
Jesus de Nazaré, peregrino no
santuário das dores e sonhos humanos! Escuta o grito que brota das entranhas da
terra e abre os nossos olhos para reconhecer-te passando por nossos caminhos.
Converte os cristãos do Brasil, para que não ignorem os desejos e sonhos que movem
a humanidade. Desperte em nós e em nossas comunidades a corajosa alegria de não
calar aquilo que vimos e ouvimos, que estamos vendo e ouvindo. E que ninguém
cale em nós o grito do desejo de bem viver, mais forte que todas as razões.
Assim seja! Amém!
FONTE: https://cebi.org.br/reflexao-do-evangelho/nao-podemos-deixar-de-anunciar-o-que-vimos-e-ouvimos/
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