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sábado, 4 de setembro de 2021

PASSOS PARA A LEITURA ORANTE DA PALAVRA

Imagem: Ângela Rocha

Nos últimos anos cresceu largamente a difusão da Leitura Orante da Palavra. Na realidade, este é um modo de orar presente já nos primeiros séculos da Igreja. E atravessou os séculos. Hoje é grande o número de evangelizadores que adotam este caminho para cultivar sua intimidade com Jesus Cristo, aprofundar sua consciência de discípulos e aprender a dialogar com seu Senhor. Todos os grandes evangelizadores, também os homens e mulheres de profunda santidade cultivaram estreitos vínculos com a Palavra de Deus. Na tradição bíblica a “Palavra” é a própria pessoa a falar.

Claro, este é um caminho que requer perseverança. É como se se reaprendesse a orar. E a (o) catequista apaixonada (o) pela Palavra, guardará profundas afeições à pessoa de Jesus. E transmitirá esta experiência. É necessário método. Existem vários. É preciso também disciplina. O que vem a seguir é um método bastante acessível, possível a todo o catequista que pretende tornar intérprete fiel do modo de Jesus amar os seus. Eis os passos a praticar. 

 

Pacificação interior:

 

Este primeiro passo ainda não é Leitura Orante. Mas sem ele não é possível, ao catequista, preparar-se para a oração. Uma das mais frequentes dificuldades que se ouve, por parte de quem está em busca de experiências pessoais de oração, refere-se ao problema da falta de concentração para poder orar. De fato, quando alguém quer se recolher, em busca do necessário silêncio interior, afloram à mente muitas questões do quotidiano: inquietações, conflitos, temores, compromissos, necessidades, contas a pagar... Ao final parece que a oração ficou sem aquele fundamental “encontro pessoal com Jesus Cristo”. 

 

Com a expressão “pacificação interior” se quer falar daquela indispensável ambientação da interioridade para o “encontro com o Senhor”. Trata-se de exercícios muito simples, de fácil execução. Mas sem eles não é possível “ouvir” o Senhor que quer falar pela sua Palavra. Estes exercícios de pacificação ainda não são propriamente oração, mas predispõem o coração e o espírito do orante. 

 

Como fazer? Eis uma sequência bem simples, mas efetiva, que muito ajuda na arte de se concentrar: a) Buscar uma posição confortável, que favoreça o relaxamento do corpo. b) Com os olhos fechados, sem pressa, tentar sentir os principais órgãos do próprio corpo. Pode-se começar pela cabeça (cabelos, olhos, ouvidos, garganta, nuca...). Depois passa-se a “sentir” os braços. Vale o mesmo para o peito, as costas, o abdômen, a coluna, os órgãos sexuais, as pernas... Este ato de “sentir” as principais partes do corpo, sem tocar nelas, é um poderoso meio para facilitar a concentração. Este primeiro exercício requer alguns minutos. Vale repetir, uma posição relaxada e os olhos fechados ajudam muito. 

 

Invocação ao Espírito Santo:

 

Após a “pacificação”, passa-se imediatamente para o primeiro momento pessoal de oração. Não é preciso muitas palavras ou muitas demoras. O mais importante é a sinceridade do que vou pedir a Deus. É um pedido até simples, porque o Pai também é simples. É um Pai Amoroso. Eis o pedido a formular neste momento de oração silenciosa: trata-se pedir que o Espírito Santo venha iluminar a mente, os afetos e todas as disposições interiores. O Espírito de Deus, que inspirou o autor sagrado a escrever, direcionará também o catequista orante, que agora vai orar com a Palavra.  

 

Pedir perdão a Deus; também perdoa:

 

Para falar com intimidade a alguém é indispensável estar em paz. Quem não está em paz com Deus, tampouco estará em paz consigo mesmo. Nem com os outros. E estando em conflito não é possível um encontro sereno; não é possível profundidade no diálogo. Também neste momento não há necessidade de multiplicar as palavras. E da parte de Deus há sempre um desejo permanente de comunhão. Daí a grandeza do perdão que Ele nos oferece. Então, em um primeiro momento o catequista manifesta o desejo de receber seu perdão. Em seguida, no segredo do coração, fala ao Senhor da disposição em perdoar. Este ato é o melhor caminho para encontrar a paz. Se não consigo perdoar em meu coração, se faltam as forças, então se pede ao Senhor que venha Ele a dar o perdão que, por enquanto, ainda não é possível ao orante. O catequista, talvez não consiga. Ele, o Senhor, consegue sempre. Ele pode “perdoar no coração de quem ora”. Vale repetir, não é preciso longo tempo. Bastam alguns minutos.  

 

Ler atentamente, lentamente, o texto escolhido do Evangelho:

 

 Agora, tendo preparado a interioridade, já pode o orante ler o texto da Palavra. Para quem ainda é iniciante neste modo de orar, é melhor começar por algum dos evangelhos sinóticos, ou seja, Mateus, ou Marcos, ou Lucas. Não deve ser uma leitura apressada. É preciso ler várias vezes, sem pressa. Este é um modo de “deixar o Senhor falar”. Na oração de muitos, é quase só o orante que fala. E fala, fala e fala. Mas chegou a hora e a graça de aprender a “ouvir” o Senhor. Aqui, muito ajuda fixar a atenção nos gestos dos personagens, nas palavras, ou frases de maior ressonância. Vale muito observar cuidadosamente os sinais e as palavras de Jesus.  

 

Imaginar o cenário apresentado pelo texto:

 

Após a leitura atenta com nossos olhos e com a inteligência, chegou a hora de “ler com a imaginação” a mesma Palavra. O que isso significa? Trata-se de criar na mente as “imagens” do que fora lido. Não é o mesmo que fantasiar. Fantasiar equivale a buscar no texto o que agrada. Imaginar é rever tudo o que foi lido segundo imagens. Mas somente aquelas imagens que o texto propõe. Aqui é preciso muita fidelidade ao texto. Eis um exemplo: a cura do Paralítico (Mt 9,1-8). É possível “ver a imagem” de Jesus dentro uma casa. E esta estava lotada de pessoas. Pode-se “ver” alguns homens em um tremendo esforço para colocar um paralítico diante de Jesus, descendo-o pelo teto. Jesus pode ser “visto”, com olhar compadecido, falando ao paralítico.... Cada gesto de todas aquelas cenas pode ser imaginado. O texto lido, visto em imagens, favorece em muito a afinidade entre a Palavra o catequista orante. 

 

Inserir-se no cenário, tornando-se um dos protagonistas

 

Este é um momento extraordinário para o encontro pessoal com Jesus. Após ler e reler o texto. Após tê-lo lido também com a imaginação, o catequista orante já dispõe de boa familiaridade com essa forma a sua leitura. Então já lhe é possível inserir-se naquelas cenas como um dos participantes. Ele passa a ser um dos personagens do que acabara de ler. As palavras pronunciadas por Jesus valem para ele: sua ordem, seu pedido, sua recomendação, sua exigência. Mas, especialmente, sua amizade e sua pessoa. Novamente, eis um exemplo: a cura de um leproso (Mc 2,1-12). O catequista orante pode identificar-se com aquele homem que tinha lepra. Não se trata, para o catequista, da doença física. Mas valem todas aquelas outras “lepras”, ou “paralisias”, ou “cegueiras”, que o impedem de se aproximar de Jesus, ou dos outros discípulos, ou dos irmãos. Para quem está orando com a Palavra, o falar e os gestos de Jesus têm mesma força e significação de quando foram pronunciadas ao homem sofredor que o procurara. Para o orante, este é um momento de grande intimidade cm seu Senhor. 

 

Minhas palavras de adesão/propósito:

 

Somente agora o catequista orante fala. A Palavra do Senhor fora já lida com a inteligência e com a imaginação. Ele, o orante, já entrou no cenário do evangelho. Tornou-se um dos personagens. É como se tivesse “entrado” no texto e ouvido o Senhor lhe falar. Chegou, pois, o momento da resposta. Será uma palavra de gratidão, uma súplica, ou a manifestação de uma esperança. O mais importante é que não sejam palavras marcadas por interesses subjetivos, de natureza egocêntrica. As melhores palavras são as de adesão e seguimento a Jesus Cristo.  Também aqui não é preciso multiplicar as palavras. Afinal “vosso Pai sabe do que tendes necessidade ante de lho pedirdes” (Mt 6,8) Não pode faltar, igualmente, o propósito e a disposição de um novo comportamento a assumir. Sem um compromisso prático a Leitura Orante seria apenas uma psicologia religiosa. E sem propósito de conversão, até mesmo a oração se torna apenas um falso consolo. 

 

Ao final, pode-se terminar com um salmo ou outra forma de oração conclusiva.  

 

D. Antônio Jose Peruzzo

Arcebispo de Curitiba – PR.

 

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