Hoje proclamamos Cristo como
rei. Trata-se de um título não isento de ambiguidades. Certamente, não seria
Ele um Reino monarca da idade média. Nem se parece com qualquer chefe de estado
do nosso século. Seu reinado não é deste mundo.
Há um perigo em chamar Deus de
rei. O risco é reforçar uma imagem de Deus que deve ser banida de nossas
mentes. Sim, banida! Que se apague a imagem de um Deus dominador, poderoso,
arbitrário, impassível, imutável. Aquele que reina acima de nós. Este não é o
Deus de Jesus Cristo.
Deus veio até nós. Veio
participar do nosso drama, de nossas dores, sofrer o que sofremos, sujar-se com
a nossa lama. É preciso que levemos mais a sério o que a teologia chama de
quenosis, termo que significa rebaixamento, esvaziamento, aniquilamento de
Deus. Devemos levar a sério, que o Pai faz a sua quenosis quando cria, pois, a criatura
lhe é infiel; que o Verbo faz a sua quenosis quando se encarna, e participa da
dor humana, do abandono na morte de cruz; que o Espírito faz a sua quenosis
quando vem até a Igreja e em cada coração. Deus se rebaixa, Deus participa da
fraqueza, Deus sai de seu pedestal onipotente.
Quantas afirmações sobre a
onipotência... É comum o discurso que exalta o poder de Deus, sua vitória, sua
força, seu domínio... Entendamos, seguidores do Cristo, que Jesus manifestou
quem é Deus: “Ele é a imagem do Deus invisível! ” (Cl 1,15). E que imagem é
esta? Do servo, daquele que é chamado de rei na cruz, daquele que foi insultado
ao morrer, daquele que morreu perdoando... onde está o seu poder? Onde está o
seu domínio? Por que se sujeitou aos ultrajes? Por exibicionismo? Não! Ele
assumiu a nossa condição com radicalidade. Em Jesus aprendemos que Deus é todo
poderoso no amor e na misericórdia.
“Salva-te
a ti mesmo se, de fato, és o Cristo? ” (Lc 23,35). “Salva-te a ti mesmo e a nós! ” (Lc 23,39). Estas frases não são
expressões exclusivas das testemunhas da morte do Filho de Deus... São
expressões que surgem na boca e no coração de muitos que vivem os seus dramas
humanos e pensam em um Deus que deveria vir, sim, em socorro trazendo a
salvação imediata. Então, quantas orações carregadas de rancor e desespero: “Salva-me Deus! Salva-me, porque tu és o Todo
Poderoso? Onde estás? Até quando terei que suportar? ” A resposta de Deus
está na entrega do Senhor, na sua quenosis. Ele não nega a lógica de sua
criação, Ele não intervém sempre de modo abrupto para mudar a lógica do mundo
que segue sofrendo as dores de parto até o dia de sua redenção. Ao contrário,
Ele assume toda esta história de limites e contrariedades e, na solidariedade,
vem ao nosso encontro sofrer conosco e nos dar a salvação a partir de baixo.
Por que? Eu não sei. Mas mesmo sendo mistério, é fácil perceber que é um
mistério de amor...
Até quando o ser humano
fabricará um ídolo que está acima dele para fazer os seus favores? A imagem da
onipotência, faz-nos onipotentes. A imagem do Deus quenosis, faz-nos humildes e
servidores. Escolhamos o nosso Deus.
E acima dele havia uma
plaquinha: “Este é o rei dos judeus”. Ironia que não revelava a totalidade de
seu ser, pois Ele é o rei de todos nós. Rei na quenosis, Rei no amor, Rei na
misericórdia que morre perdoando e oferecendo o Paraíso ao ladrão
arrependido...
Arquidiocese de Curitiba - PR
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