Ícone de Rublev /
Domínio Público via Wikipédia
O mais excelso ícone
russo da Trindade Santíssima
Tido em alta estima por cristãos do Oriente e do Ocidente,
este ícone é uma das mais profundas visualizações jamais produzidas sobre o
Deus Uno e Trino
“É absurdo e impróprio pintar em ícones a Deus Pai com
barba cinza e o Filho Unigênito em seu seio com uma pomba entre ambos, posto
que ninguém viu o Pai segundo a Sua Divindade, que o Pai não tem carne […] e
que o Espírito Santo não é, em essência, uma pomba, mas, em essência, Deus”
(Grande Sínodo de Moscou, 1667).
Para a Igreja Ortodoxa Russa, representar a Santíssima
Trindade na arte tem sido uma questão controversa ao longo dos últimos mil
anos. Embora o Concílio de Niceia, em 787, tenha permitido a representação
artística de Deus, a Igreja Ortodoxa Russa se mostrou descontente com as
imagens populares de Deus Pai e de Deus Espírito Santo.
Eles consideraram que o homem de barba grisalha e a pomba não
faziam jus ao mistério insondável do Deus trino e uno. Em vez daquelas
difundidas imagens de Deus, eles optaram por usar o ícone da Trindade de Andrei
Rublev como adequado para representar o Pai, o Filho e o Espírito Santo.
O ícone russo é difícil de entender para as pessoas de fora
da tradição ortodoxa, e, à primeira vista, nem parece representar a Santíssima
Trindade. A cena central do ícone vem do livro do Gênesis, quando Abraão recebe
três estranhos em sua tenda:
“O Senhor apareceu a Abraão nos carvalhos de Mambré, quando
ele estava assentado à entrada de sua tenda, no maior calor do dia. Abraão
levantou os olhos e viu três homens de pé diante dele. Levantou-se no mesmo
instante da entrada de sua tenda, veio-lhes ao encontro e prostrou-se por terra
(…) Abraão serviu aos peregrinos [pães, um novilho tenro, manteiga e leite],
conservando-se de pé junto deles, sob a árvore, enquanto comiam” (cf. Gênesis 18, 1-8).
O ícone de Rublev apresenta a cena com os três anjos,
semelhantes na aparência, sentados a uma mesa. A casa de Abraão aparece ao
fundo, bem como um carvalho atrás dos três convidados. Embora o ícone pinte
esta cena do Antigo Testamento, Rublev usou o episódio bíblico para fazer uma
representação visual da Trindade que se encaixa nas estritas diretrizes da
Igreja Ortodoxa Russa.
O simbolismo da imagem é complexo e procura resumir a
doutrina teológica da Igreja sobre a Santíssima Trindade. Primeiro: os três
anjos são idênticos em aparência, correspondendo à fé na unicidade de Deus em
três Pessoas. No entanto, cada anjo veste uma roupa diferente, trazendo à mente
que cada pessoa da Trindade é distinta. O fato de Rublev recorrer aos anjos
para retratar a Trindade é também um lembrete da natureza de Deus, que é espírito
puro.
Os anjos são mostrados da esquerda para a direita na ordem em
que professamos nossa fé no Credo: Pai, Filho e Espírito Santo. O primeiro anjo
veste azul, simbolizando a natureza divina de Deus, e uma sobrepeça púrpura,
indicando a realeza do Pai.
O segundo anjo é o mais familiar, vestindo trajes tipicamente
usados por Jesus na iconografia tradicional. A cor carmesim simboliza a
humanidade de Cristo, enquanto o azul é indicativo da sua divindade. O carvalho
atrás do anjo nos lembra a árvore da vida, no Jardim do Éden, bem como a cruz
sobre a qual o Cristo salvou o mundo do pecado de Adão.
O terceiro anjo veste o azul da divindade e uma sobrepeça
verde, cor que aponta para a terra e para a missão da renovação do Espírito
Santo. O verde é também a cor litúrgica usada em Pentecostes na tradição
ortodoxa e bizantina. Os dois anjos à direita do ícone têm a cabeça
ligeiramente inclinada em direção ao outro, ilustrando que o Filho e o Espírito
procedem do Pai.
No centro do ícone há uma mesa que se assemelha a um altar.
Colocado sobre a mesa, um cálice dourado contém o bezerro que Abraão preparara
para seus hóspedes; o anjo central parece estar abençoando a refeição. A
combinação dos elementos nos lembra o sacramento da Eucaristia.
Embora não seja a representação mais direta da Santíssima
Trindade, é uma das mais profundas jamais produzidas. Permanece nas tradições
ortodoxas e bizantinas a principal maneira de representar o Deus Uno e Trino.
Este ícone, de fato, é tido em alta estima também na Igreja Católica Romana e é
frequentemente usado por catequistas para ensinar sobre o mistério da Trindade.
E a Trindade é, em suma, um mistério – e sempre o será nesta
terra. Às vezes, porém, nos são concedidos vislumbres da vida divina, e o ícone
de Rublev nos permite espreitar brevemente por trás do véu.
Philip Kosloski.
FONTE: https://pt.aleteia.org/2016/05/24/o-excelso-icone-russo-que-nos-manifesta-o-misterio-da-trindade-santissima/
Mai 24, 2016.
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