1º DOMINGO DO ADVENTO: Lucas 21,25-28.34-36
“Quando começarem a acontecer estas
coisas, reanimai-vos e levantai as vossas cabeças; porque se aproxima a vossa
libertação” (Lc. 21.28)
Na tradição cristã, inauguramos hoje o primeiro domingo do advento, que
de acordo com o calendário, refere-se aos 04 domingos que antecedem a
celebração do Natal de Jesus. Nesse período, não apenas a comunidade cristã,
mas as mais diversas comunidades espalhadas pelo mundo, são convidadas a se
envolverem com a mensagem de esperança em um novo tempo que há de vir. Neste
primeiro domingo, o convite é para que os corações orantes reflitam e orem
olhando para as necessidades reais e urgente de seu tempo e identifique sinais
de clamor pela segunda vinda do glorioso Jesus, trazendo salvação hoje a agora.
Tendo em vista do que se trata o período e qual é a proposta do advento,
ninguém mais indicado do que o apóstolo Lucas para nos inspirar com uma
narrativa profunda, provocadora e animadora do evangelho de Jesus.
É bem provável que Lucas tenha concluído sua narrativa do evangelho por
volta do ano 85, e escreve voltado para um público de pessoas em situação de
pobreza ao lado de pessoas ricas e poderosas que detinham o controle do sistema
religioso, político e econômico da época, ambas inseridas em cidades grandes
como por exemplo a Antioquia da Síria, Éfeso e até mesmo a cidade da Grécia.
Cidades governadas pelo império Romano que se sustentavam com um sistema de
trabalho escravagista e indecentes taxações de impostos. Além das cruéis
práticas do sistema econômico de exploração e dominação, as comunidades lucanas
também sofriam com a perseguição política de intolerância religiosa ao se
declararem seguidoras do Jesus de Nazaré, aquele que foi torturado e morto por
levar mensagem de libertação ao povo pobre e oprimido. Diante disso, é
importante ressaltar que a mensagem de Lucas faz um caminho da periferia para o
centro. Jesus inicia na Galileia e termina em Jerusalém e é ali no centro de
Jerusalém, diante do templo de pedras que Jesus denuncia as práticas de
ganância, soberba, mas também aponta para sinais de profunda piedade como é o
caso da viúva pobre que doa tudo o que tem (Luc. 21.01…). Também é diante do
templo que Jesus avisa sobre os dias difíceis e de ódio que estavam por vir
contra suas seguidoras e seguidores, mas, também é ali, que ele anuncia
esperança de vida para aquelas e aqueles que se mantivessem perseverantes (Luc.
21.06-19…). De fato, os anos que se seguiram foram de total perseguição contra
a comunidade seguidora de Jesus o Cristo.
Por conta de todo esse cenário de desolação, as pessoas daquelas
comunidades estavam atravessando um momento de crise, manifestando cansaço,
desânimo e descrença. Nesse sentido, Lucas escreve com a intensão de outra vez
animar e reavivar a fé das seguidoras e seguidores de Jesus. O evangelista
inicia sua narrativa lembrando a comunidade de que em Cristo temos o Deus da
salvação e que essa salvação é para hoje.: “Nasceu-vos hoje um Salvador, que é
o Cristo-Senhor” (Lc 2,11).
A leitura sobre o contexto da comunidade lucana é um convite para
levantar o olhar sobre as nossas comunidades e apontar clamores de salvação e
misericórdia. Assim como nos dias atuais, fica evidente que havia naquele
período um projeto de destruição em curso que se materializava nas ações de
controle do poder religioso e político de sua época. Hoje, observamos que esse
projeto de morte se apresenta de diversas maneiras, seja associada a falta de
recursos para a saúde, moradia digna, alimentação, trabalho e renda, ou na
falta de espaço de respeito e vivências das experiências subjetivas de cada
indivíduo.
Hoje no Brasil, ainda em meio a uma pandemia, por falta de um plano
eficiente, urgente e comprometido com a promoção da vida de todas as pessoas,
chegamos a um número absurdo de mais de 600.000 mortes decorrentes da pandemia
provocada pela COVID-19; o genocídio da juventude negra é uma realidade cruel
vivida diariamente no Brasil; somos pelo 12º ano o país que mais mata pessoas
LGBTQIAP+; ocupamos o 5º lugar no ranking mundial de feminicídio, segundo dados
da ONU; o Brasil é extremamente vulnerável, uma realidade que é
vivenciada por milhões de pessoas que estão hoje abaixo da linha da pobreza e
outros milhões que estão na pobreza; o Brasil tem cerca de 40 milhões de
trabalhadoras e trabalhadores sem carteira assinada e cerca de 12 milhões de
desempregadas e desempregados, segundo dados da (OIT); em pesquisa realizada entre agosto e
dezembro de 2020, destaca que a insegurança alimentar no Brasil, que alcançou
seu nível mínimo histórico em 2013 (22,6%), já atinge 36,7% dos domicílios
brasileiros, conforme constatado pela IBGE. 2017/2018, bem antes, portanto, do
início da pandemia[1].
O evangelho do Jesus da Galileia continua provocando e inspirando as
comunidades de fé a assumirem sua missão profética de denúncia de toda e
qualquer injustiça e anunciar um novo tempo de vida abundante para todas as
pessoas. Nesse primeiro domingo do advento, toda a comunidade cristã é
convidada a se posicionar perseverante como reais agentes de uma era promotora
de justiça e paz onde todas as pessoas possam desfrutar da salvação
misericordiosa de Jesus, hoje e sempre. Levantemos as nossas cabeças pois está
chegando o tempo da vossa salvação. Advento é espera do verbo esperançar, é fé
movida em profunda compaixão.
Texto: Kezzia Cristina Silva
cartacapital.com.br
Fonte: cebi.org.br
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