Que tipo de mundo deixaremos
às gerações futuras? É a pergunta que o Papa Francisco faz na Encíclica Laudato si, sobre o Cuidado da Casa
Comum. Também tema da Campanha da Fraternidade deste ano, a “Casa Comum”,
precisa ser cuidada por todos.
COMO CUIDAR DE NOSSA “CASA
COMUM”
Cuidar da Terra é cuidar do Sagrado que
arde em nós e que nos convence de que a vida vale mais que todas as riquezas
deste mundo.
Hoje
para cuidar da Terra como nos sugeriu detalhadamente o Papa Francisco em sua encíclica
“Cuidado da Casa Comum” exige-se “uma conversão ecológica global”, “mudanças
profundas nos estilos de vida, nos modelos de produção e de consumo, nas
estruturas consolidadas de poder” (n.5). Esse propósito jamais será alcançado
senão amarmos efetivamente a Terra como nossa Mãe e soubermos renunciar e até
sofrer para garantir sua vitalidade para nós e para toda a comunidade de vida
(n.223). A Mãe Terra é a base que tudo sustenta e alimenta. Nós não podemos
viver sem ela. A sistemática agressão que sofreu nos últimos séculos tirara-lhe
o equilíbrio necessário. Eventualmente, poderá continuar pelos séculos afora,
mas sem nós.
No
dia 13 de agosto de 2015 ocorreu o Dia da Sobrecarga da Terra (The Overshoot Day), dia em que se
constatou a ultrapassagem da biocapacidade da Terra em atender as demandas
humanas. Precisa-se de 1,6 planetas para atendê-las. Em outras palavras. Isso
demonstra que o nosso estilo de vida é insustentável. Nesse cálculo não estão
incluídas as demandas da inteira comunidade de vida. Isso torna mais urgente a
nossa responsabilidade pelo futuro da Terra, de nossos companheiros de
caminhada terrenal e de nosso projeto planetário.
Como
cuidar da Terra? Em primeiro lugar há que considerar a Terra como um Todo Vivo,
sistêmico, no qual todas as partes se encontram interdependentes e
inter-relacionadas. A Terra-Gaia* fundamentalmente
é constituída pelo conjunto de seus ecossistemas e com a imensa biodiversidade
que neles existe e com todos os seres animados e inertes que coexistem e sempre
se inter-relacionam como não se cansa de afirmar o texto papal, bem na linha do
novo paradigma ecológico.
Cuidar
da Terra como um todo orgânico é manter as condições pré-existentes há milhões
e milhões de anos que propiciam a continuidade da Terra, um super Ente vivo, Gaia. Cuidar de cada ecossistema é
compreender as singularidades de cada um, sua resiliência, sua capacidade de
reprodução e de manter as relações de colaboração e mutualidade com todos os
demais já que tudo é relacionado e includente. Compreender o ecossistema é
dar-se conta dos desequilíbrios que podem ocorrer por interferências
irresponsáveis de nossa cultura, voraz de bens e serviços.
Cuidar
da Terra é principalmente cuidar de sua integridade e vitalidade. É não
permitir que biomas inteiros ou toda uma vasta região seja desmatada e assim se
degrade, alterando o regime das chuvas. Importante é assegurar a integridade de
toda a sua biocapacidade. Isso vale não apenas para os seres orgânicos vivos e
visíveis, mas principalmente para os microrganismos. Na verdade, são eles os
ignotos trabalhadores que sustentam a vida do Planeta. Diz-nos o eminente
biólogo Edward Wilson que “num só grama de terra, ou seja, menos de um punhado
de chão, vivem cerca de 10 bilhões de bactérias, pertencentes a até 6 mil
espécies diferentes” (A criação, 2008,p.26). Por aí se demonstra,
empiricamente, que a Terra está viva e é realmente Gaia, superorganismo vivente
e nós, a porção consciente e inteligente dela.
Cuidar
da Terra é cuidar dos “commons”, quer
dizer, dos bens e serviços comuns que ela gratuitamente oferece a todos os
seres vivos como água, nutrientes, ar, sementes, fibras, climas etc. Estes bens
comuns, exatamente por serem comuns, não podem ser privatizados e entrar como
mercadorias no sistema de negócios como está ocorrendo velozmente em todas as
partes. A Avaliação Ecossistêmica do Milênio, inventário pedido pela ONU de uns
anos atrás, no qual participaram 1.360 especialistas de 95 países e revisados
por outros 800 cientistas trouxeram resultados amedrontadores. Entre os 24
serviços ambientais, essenciais para a vida, como água, ar limpo, climas
regulados, sementes, alimentos, energia, solos, nutrientes e outros, 15 estavam
altamente degradados. Isto sinaliza claramente que as bases que sustentam a
vida estão ameaçadas.
De ano para ano, todos os índices estão piorando. Não sabemos quando esse processo destrutivo vai parar ou se transformar numa catástrofe. Havendo uma inflexão decisiva como o temido “aquecimento abrupto”, que faria o clima subir entre 4-6 graus Celsius, como advertiu a comunidade científica norte-americana, conheceríamos dizimações apocalípticas afetando milhões de pessoas. Temos confiança de que iremos ainda despertar. Mais que tudo cremos que “Deus é o Senhor soberano amante da vida” (Sb 11,26) e não deixará acontecer semelhante Armagedom.
De ano para ano, todos os índices estão piorando. Não sabemos quando esse processo destrutivo vai parar ou se transformar numa catástrofe. Havendo uma inflexão decisiva como o temido “aquecimento abrupto”, que faria o clima subir entre 4-6 graus Celsius, como advertiu a comunidade científica norte-americana, conheceríamos dizimações apocalípticas afetando milhões de pessoas. Temos confiança de que iremos ainda despertar. Mais que tudo cremos que “Deus é o Senhor soberano amante da vida” (Sb 11,26) e não deixará acontecer semelhante Armagedom.
Cuidar
da Terra é cuidar de sua beleza, de suas paisagens, do esplendor de suas
florestas, do encanto de suas flores, da diversidade exuberante de seres vivos
da fauna e flora.
Cuidar da Terra é cuidar de sua melhor produção que somos nós seres humanos, homens e mulheres especialmente os mais vulneráveis. Cuidar da Terra é cuidar daquilo que ela através de nosso gênio produziu em culturas tão diversas, em línguas tão numerosas, em arte, em ciência, em religião, em bens culturais especialmente em espiritualidade e religiosidade pelas quais nos damos conta da presença da Suprema Realidade que subjaz a todos os seres e nos carrega na palma de sua mão.
Cuidar da Terra é cuidar de sua melhor produção que somos nós seres humanos, homens e mulheres especialmente os mais vulneráveis. Cuidar da Terra é cuidar daquilo que ela através de nosso gênio produziu em culturas tão diversas, em línguas tão numerosas, em arte, em ciência, em religião, em bens culturais especialmente em espiritualidade e religiosidade pelas quais nos damos conta da presença da Suprema Realidade que subjaz a todos os seres e nos carrega na palma de sua mão.
Cuidar
da Terra é cuidar dos sonhos que ela suscita em nós, de cujo material nascem os
santos, os sábios, os artistas, as pessoas que se orientam pela luz e tudo
o que de sagrado e amoroso emergiu na história.
Cuidar
da Terra é, finalmente, cuidar do Sagrado que arde em nós e que nos convence de
que é melhor abraçar o outro do que rejeitá-lo e que a vida vale mais que todas
as riquezas deste mundo. Então ela será de fato a Casa Comum do Ser.
Leonardo Boff
* Hipótese de Gaia: teoria científica que descreve a Terra como um
único organismo vivo. Propõe que a biosfera e os componentes físicos da terra
(atmosfera, criosfera, hidrosfera e litosfera) são intimamente integrados de
modo a formar um complexo sistema interagente que mantêm as condições
climáticas e biogeoquímicas em equilíbrio.
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