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sábado, 28 de agosto de 2021

O EVANGELHO É MUITO MAIS IMPORTANTE QUE OS COSTUMES E TRADIÇÕES

22º DOMINGO DO TEMPO COMUM: Marcos 7,1-23

 A fidelidade de Deus à sua misericórdia e compaixão pela humanidade nos interpela a assumir nossa responsabilidade pelos males que a ferem e a reverter nossas prioridades, quase sempre muito estreitas ou egoístas. E um dos primeiros passos é romper com algumas práticas que adquiriram força de tradição e de verdade: a ilusão de que a fé pode ser vivida sem ligação com a vida concreta; a mania de pedir que Deus mude o mundo sem nosso empenho; a hipocrisia de ostentar publicamente uma retidão que não vai além da própria pele; o mito de que a única saída para os problemas sociais é cada um cuidar de si mesmo.

O amor solidário e compassivo de Deus, manifestado e atestado definitivamente em Jesus Cristo, não muda jamais. E não muda também o amor como único caminho possível para construir outro mundo. O apóstolo Tiago insiste: “Ele nos gerou por meio da Palavra da verdade para que nos tornássemos as primeiras dentre as suas criaturas”. E acrescenta: “Religião pura e sem mancha diante de Deus, nosso Pai, é esta: socorrer os órfãos e as viúvas em aflição e manter-se livre da corrupção do mundo.” Nosso batismo expressa esta vocação dos cristãos: ser os primeiros a viver o amor como princípio, meio e fim.

Quando falamos em amor não estamos nos referindo a um vago sentimento interior, mas a um dinamismo envolvente, que encontra em Jesus sua máxima expressão e concretude: trata-se de reconhecer os outros em sua dignidade, de valorizar sua verdade e atender suas necessidades. E isso comporta decisões e ações concretas que passam longe do medo de não sujar as mãos, que nos envolvem em lutas, que nos levam a compartilhar os sofrimentos e humilhações que decorrem disso.  É isso que significa manter-se livre da corrupção, socorrer os órfãos e as viúvas, como diz o apóstolo Tiago.

É lamentável observar que inda hoje alguns cristãos, inclusive consagrados e ordenados, estejam mais preocupados com a limpeza das mãos ou com a roupa adequada daqueles que se aproximam da eucaristia que com as fraturas, divisões e injustiças que ferem o corpo de Cristo no corpo dos homens e mulheres humilhados e excluídos da mesa da vida. Eles priorizam a limpeza das toalhas, patenas e cálices, dão a máxima importância a panos e hábitos vistosos, mas pouco se importam com as atitudes verdadeiramente anti-evangélicas que precisam ser combatidas e mudadas.

É esta a “lei” que os legistas e fariseus defendem diante da liberdade de Jesus e dos seus discípulos. “Por que os teus discípulos não seguem a tradição dos antigos, pois comem o pão sem lavar as mãos?” A eles não interessa a partilha dos pães e peixes que alimentara uma multidão, mas o fato de que os discípulos e todo o povo haviam comido sem lavar as mãos! E o pior é que eles têm seguidores/as hoje, inclusive fora do âmbito religioso: pessoas que querem salvar as leis do mercado à custa da fome que mata milhões. O caminho trilhado e proposto por Jesus de Nazaré é bem outra coisa!

A verdade é que alguns costumes irrelevantes e hábitos perniciosos vão conquistando uma importância cada vez maior, e acabam aparecendo à nossa consciência como expressões da vontade de Deus. Quanta discussão sobre se é permitido receber a hóstia na mão ou não, e quanta polêmica em torno da prática de chamar leigos e leigas a proclamar o Evangelho numa celebração eucarística! E sem falar na comunhão aos casais separados ou recasados. Tradições humanas que ocupam o lugar da vontade de Deus!

Jesus estabelece um princípio que “crava” o discernimento de cada dia, e em todos os casos: “O que vem de fora e entra na pessoa não a torna impura; as coisas que saem de dentro da pessoa é que a tornam impura”. O que nos torna dignos ou indignos não é nossa condição social, nosso grau de estudo, nossos recursos e bens, nossa orientação sexual ou nossa pertença religiosa, mas as ações e decisões que tomamos, as relações que estabelecemos. “Pois é de dentro do coração das pessoas que saem as más intenções, como a imoralidade, roubos, crimes, adultério, ambições sem limites, maldades…”, esclarece Jesus.

Jesus, Palavra viva e libertadora do Pai, tu nos pedes que não confundamos a Boa Notícia que liberta com nossas doutrinas, medos e interesses. Tu nos ensinas que não são os aspectos externos que nos fazem bons ou ruins aos olhos do teu Pai. Abre nossos olhos, nossos ouvidos e nosso coração à tua Boa Notícia. Ajuda-nos a reinventar evangelicamente tua Igreja, tão devedora de tradições fossilizadas. E ajuda-nos a distinguir, entre nossas lideranças, os trapaceiros daqueles que tem compromisso com o povo. Assim seja! Amém!

Texto do Itacir Brassiani

Fonte: cebi.org.br

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