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quinta-feira, 16 de junho de 2016

A WEB DAS COISAS...

Amo escrever! E ser convidada para escrever junto com uma pessoa que a gente admira, melhor ainda. Em 2010, o Alberto Meneguzzi me convidou para escrever este artigo com ele e o resultado foi (sou suspeita pra falar, mas...) muito bom! É um texto longo, mas, vale a pena ler. 


*Alberto Meneguzzi
Ângela Rocha

Uma reportagem especial publicada no jornal Zero Hora de Porto Alegre, mostra o que vem por aí em termos de tecnologia. “Olhar para o futuro nem sempre significa ver o invisível” diz a apresentação da matéria.  A reportagem mostra previsões de inovações tecnológicas para os próximos 10 anos e faz um alerta: “Todas as previsões indicam melhorias consideráveis em relação à atualidade, mas também sugerem mudanças radicais de comportamento”.  É impressionante, uma das dez previsões apresentadas diz que num curto espaço de tempo, a chamada web das coisas (onde tudo se conecta a internet) será massificada, “eletrodomésticos, lâmpadas, portas e janelas entre outros dispositivos, estarão ligados em rede e isso possibilitará controle a distância: mesmo fora de casa será possível programar um aspirador de pó.” Outra previsão é que o quadro negro, utilizado nas escolas, será eletrônico. Com isso, as informações atingem os notebooks dos alunos (fornecidos pela própria escola) via transmissão sem fio. O DVD, para se ter uma ideia, já está ultrapassado e seu sucessor, o blu-ray já está quase também, perdendo espaço para as memórias flashs. Já não se fala mais em Giga (byte), agora a conversa de Tera(byte) pra lá. Ufa!

A reportagem trata ainda de carros megaflex, com uma série de tecnologias ainda mais avançadas que as atuais, chips que poderão ser úteis para o monitoramento de tratamentos de seres humanos mesmo a milhares de quilômetros de distância e até de lentes de contato que transformarão o olho humano em algo semelhante a uma tela de TV: “Por meio de uma conexão sem fio, será possível receber imagens de um computador a uma distância de até 15 a 20 metros, visualizado, por exemplo, interlocutores em conversas via internet”. E tudo deverá estar disponível até o final da próxima década.

Isso tudo quando algumas pessoas (inclusive os autores deste artigo!), ainda encontram dificuldades no manuseio do próprio celular! Até mesmo achar um nome na agenda de telefones, ou operar o controle remoto da TV que ainda está na tecnologia analógica, são tarefas que precisam, no mínimo, de um tutorial do Google. Na verdade, somos de uma geração que nasceu no final da década de 60, o que nos faz quase jurássicos em termos de tecnologia. A primeira transmissão em cores na televisão aconteceu quando tínhamos cinco ou seis anos. A internet, para nós, não tem mais do que dez anos e os telefones celulares mais sofisticados, não ficam muito longe disso.

A geração Z

Na mesma reportagem, está publicada uma entrevista com Andrea Bisker. Ela é Diretora para a América Latina de uma empresa britânica, que trata sobre o impacto das novas tecnologias nas relações pessoais. Segundo Andrea, a geração “Z” (aqueles que nasceram após o ano dois mil, chamados nativos digitais) vive num mundo conectado, mas que causa angústia. “Tudo é muito rápido, e isso pode fazer com que esta geração retome as raízes familiares para encontrar conforto”. Ela diz também que esta geração “Z” não tem paciência para relações: “A independência vem em função de uma sociedade chamada líquida. Também é líquido o amor. Significado, e não dinheiro é a grande mudança.” Andrea Bisker faz, porém, um alerta interessante: “Ideais éticos e ecológicos irão predominar. As empresas já perceberam que essa geração Z vai comprar de quem é sustentável.” Será? Esperemos que sim.

Como catequistas, convivemos com esta geração “Z” já há um bom tempo. O que dá para notar é que os jovens estão sendo educados nas questões ambientais. Falam de reciclagem, efeito estufa, questões climáticas, camada de ozônio e tantos outros assuntos correlatos, com uma desenvoltura fora do comum. A escola tem feito o seu papel e terá que fazer muito mais daqui por diante. A Igreja ainda não encontrou a fórmula para tratar disso de maneira direta e sem rodeios. Questões ambientais quase nunca são abordadas nos conteúdos da catequese e quando são, estão colocadas de forma pouco atrativa.

Por um lado, esta geração “Z” discute abertamente quase tudo que se refere ao meio ambiente, por outro, se mostra consumista ao extremo. São jovens facilmente influenciados pela propaganda e, ao mesmo tempo, preocupados com o meio ambiente. Geram cada vez mais resíduos, descartam com uma rapidez voraz uma série de produtos, mas dão aulas de como reciclar de forma correta os resíduos que são produzidos em suas próprias casas. É uma contradição desafiadora. Observa-se na catequese, que esta geração “Z”, pelo menos nas comunidades urbanas, está num caminho sem volta na relação com as novas tecnologias. A grande maioria sabe manusear um computador desde criança e, com isso, cria uma linguagem própria, se alia em comunidades, busca relacionamentos diferentes numa comunicação quase que instantânea. Já enterramos o Orkut e o MSN; agora e-mails, blogs, estão quase no mesmo caminho; Messenger, twitter, Facebook, Instagram, Myspace... Nem acabamos de listar e, provavelmente, já tem outra rede social, despontando por aí. Os celulares então, estão cada vez mais avançados, hoje, eles dão acesso a internet, tiram fotos, filmam, baixam jogos, músicas, vídeos e podem ser acessados por um comando de voz, se transformando, quase, em extensões do corpo desta garotada. E o Whatsapp? Quem não está nele, está fora do planeta terra!

Mas não nos cabe aqui um aprofundamento em novas tecnologias, até porque, nossa capacidade é um tanto limitada. Nossa intenção é fazer uma relação com a catequese, com o “fazer” dos catequistas, com o linguajar usado, com as técnicas utilizadas nos encontros de catequese e, com a postura que precisamos adotar frente a uma era que, veio para ficar, e está, cada vez mais, influenciando comportamentos e atitudes.

O catequista, a catequese e as inovações tecnológicas

Uma coisa que se pode perceber na catequese, é o “descaso” da maioria dos catequistas e das comunidades-igrejas, com relação a essas novas tecnologias. Quando alertados sobre o nível e o volume de informações que crianças e jovens, trazem hoje, como bagagem para a catequese, muitos evangelizadores acreditam que a “boa e tradicional” catequese dará um jeito nisso. Ignorar que os jovens têm muito mais conhecimento de mundo do que nós é, sem dúvida, um dos motivos para que muitos deles fujam da catequese e, consequentemente, da Igreja. Os catequistas precisam estar “antenados”, saber das novas “modas” e tendências, precisam saber como os jovens se comunicam e como “leem” esse novo mundo.

Claro que uma adesão maciça a essas novas formas de comunicação, não é a solução. Não aprenderemos de uma hora para outra, a fazer “catequese virtual”. Nem é esse o caso. Igualdade, fraternidade, justiça e amor incondicional (que são as mensagens da catequese), podem até ser transmitidas via “online”. Mas a “via” abraço, carinho e olhos nos olhos, não pode ser deixada de lado. Igreja ainda é “comunidade”, laço, pertença, encontro e, sobretudo, relação humana. O que deve se transformar é nossa postura com relação a isso tudo. É a nossa linguagem, a nossa aceitação e entendimento de que esse mundo que está aí é o mesmo, mas, visto de outra forma, na maioria das vezes, por meio de uma tela cada vez com menos polegadas. E não dá para pedir para descer como se fosse trem. Tem que continuar a viagem.

Aliás, o Papa Bento XVI na mensagem que escreveu para a 43ª edição do Dia Mundial das Comunicações, em 2009, já salientava que o desejo de interligação e o instinto de comunicação, que se revelam tão naturais na cultura contemporânea, na verdade, são apenas manifestações modernas daquela propensão fundamental e constante que têm os seres humanos para se ultrapassarem a si mesmos entrando em relação com os outros. Segundo ele, “quando nos abrimos aos outros, damos satisfação às nossas carências mais profundas e tornamo-nos de forma mais plena, humanos”.

A alegação de muitas lideranças pastorais, leigas ou não, para rejeitar ou ignorar essa nova postura que envolve um comportamento diferente em relação às inovações tecnológicas, é que a realidade urbana das grandes cidades é uma (nem todos têm acesso as novas tecnologias) e a realidade rural, das pequenas cidades e das periferias, é outra. O que se esquece é que, mesmo o Brasil sendo um país essencialmente agrícola, 80% da população é urbana (Fundo de População das Nações Unidas – Agência Estado, 2010). Isso faz com que comunidades inteiras, mesmo estando em grandes centros, encontrem-se em estado de grande pobreza e sejam excluídas da sociedade e da “era da informação”. Paralelamente observa-se que muitos jovens das camadas mais pobres possuem celular e que as Lan Houses, estão sempre cheias. A grande maioria das escolas públicas ensina informática aos seus alunos, mesmo as de periferia. O jovem pode não “ter” um computador, mas tem acesso a ele, sem dúvida alguma. Da televisão nem se fala: hoje ela é um “computador”, é só conectar os periféricos.

Então, de que realidade é essa que estamos falando? A maioria esmagadora das nossas crianças e jovens sabem, sim, em que mundo estão vivendo. Muitos dos nossos catequistas é que parecem não saber. E mais, se sou catequista numa comunidade onde as pessoas não tem acesso a esse tipo de informação, é meu dever proporcionar isso a elas. Fazer com que elas continuem alheias a essa nova realidade é trabalhar contra o projeto da catequese. É preciso fazer com que, além de “estarem ‘no’ mundo, elas estejam ‘com’ o mundo” (Paulo Freire, educador). Ao mesmo tempo, nessa conexão entre o novo e o antiquado, é preciso fazer alertas importantes para as nossas crianças e jovens.

Bento XVI, fala ainda em sua mensagem, sobre o perigo de que, com este avanço tecnológico, as relações entre as pessoas se transforme em algo descartável. O sumo pontífice diz que é preciso existir uma harmonia entre ambos: “O conceito de amizade logrou um renovado lançamento no vocabulário das redes sociais digitais que surgiram nos últimos anos. Este conceito é uma das conquistas mais nobres da cultura humana. Nas nossas amizades e através delas crescemos e desenvolvemo-nos como seres humanos. Por isso mesmo, desde sempre a verdadeira amizade foi considerada uma das maiores riquezas de que pode dispor o ser humano”. O Papa pede para que o conceito e as experiências de amizade não sejam banalizadas, que a família e as pessoas que fazem parte de nossa realidade cotidiana, na escola e no trabalho, não sejam deixadas de lado em detrimento a essa nova cultura do online. Diz ainda: “De fato, quando o desejo de ligação virtual se torna obsessivo, a consequência é que a pessoa se isola, interrompendo a interação social real. Isto acaba por perturbar também as formas de repouso, de silêncio e de reflexão necessárias para um desenvolvimento humano saudável”.

Parece cômodo ignorar tudo isso. Acreditar que as mudanças vão demorar a acontecer. Porém, o que se vê, é que a cada dia, novos meios e tecnologias são criadas a serviço do homem. E não podemos esquecer que também estamos “a serviço” deste mesmo homem, como irmãos que somos. E que a tecnologia não é um “fim”. É um meio, uma conexão. Então é preciso que a Catequese e a Igreja como um todo, se preocupem, e muito, com a web das coisas. Os catequistas precisam se “conectar”, caso contrário, perderemos o download (bonde) da história. E esse, não passa de novo. Nem fica disponível para sempre...

(Janeiro 2010, atualizado em 2016).

* Sobre os autores:
Alberto Meneguzzi – Catequista de Crisma e Jornalista em Caxias do Sul - RS
Angela Rocha – Catequista de Crisma em Londrina – Paraná.

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