Estamos iniciando o Ano Catequético e precisamos estar atentos às leituras do Evangelho Dominical. Este é o Ano Litúrgico A, com leituras do Evangelho de São Mateus. Vamos conhecer um pouco mais deste Evangelho e do Ano Litúrgico?
O que são as letras A, B e C do Ano litúrgico?
As
leituras Bíblicas que ocorrem nas celebrações são determinadas de acordo com o Ano Litúrgico, criado para
acompanharmos através das leituras dos textos bíblicos (evangelho e outros
livros) a vida de Jesus em ordem cronológica do nascimento até a ascensão aos
céus. Assim ouvimos nas celebrações textos que falam do anúncio do Messias, da
encarnação, de seu ministério público, com seus milagres e curas, do chamado ao
discipulado, discursos, parábolas até culminarmos com morte e ressurreição nos
preparando para a Parusia, ou seja, do Cristo Rei do Universo no final do ano
litúrgico. A ideia desta distribuição de textos bíblicos ao longo de três anos
tem como objetivo se ter uma visão e leitura de toda a Bíblia.
O
rito romano, utilizado nas celebrações da Igreja católica possui um conjunto de
leituras bíblicas que se repetem a cada três anos perpassando os domingos e as
solenidades. A cada ano, a liturgia das celebrações segue uma sequencia de
leituras próprias, divididas em
anos A , B e C.
-
No ano “A” a leitura principal do
evangelho na celebração segue o Evangelho de São Mateus;
-
No ano “B”, a leitura principal do
evangelho segue o Evangelho de São Marcos;
-
No ano “C”, a leitura principal do
evangelho segue o Evangelho de São Lucas.
Já
o Evangelho de São João é reservado para as ocasiões especiais, principalmente
as grandes Festas e Solenidades, para este evangelho não existe um ano
litúrgico.
O ano litúrgico inicia-se no primeiro domingo do
Advento (cerca de quatro semanas antes do Natal) e se encerra com a solenidade
de Cristo Rei do Universo do ano seguinte.
ESTUDO DO EVANGELHO DE
SÃO MATEUS
PLANO GERAL DO EVANGELHO DE
MATEUS
1.
Evangelho
da Infância de Jesus è1,1-2,23;
Mateus narra infância de Jesus para proclamar que Ele é o Herdeiro das
promessas feitas a Abraão e a David (Genealogia), é o descendente de David
anunciado pelos Profetas (1ª passagem), reúne os traços de Salomão, o sábio (2ª
passagem) e de Moisés, o salvador do povo (3ª passagem). Os pagãos vêm a Ele
com presentes, como o tinham anunciado os profetas (2ª passagem).
2.
Anúncio
do Reino do Céu è
3,1-25,46; São Mateus mostra-nos o princípio do Reino dos Céus: Jesus é
anunciado e proclamado como Filho de Deus, nas tentações cumpre a vontade do
Pai como verdadeiro Filho e no sermão ensina-nos a cumprir essa mesma vontade
de Deus, para podermos receber o Reino dos Céus (5, 20) e ser também filhos de
Deus (5, 45). Os capítulos 8 e 9 do Evangelho mostra o poder do Reino dos Céus;
Cristo é Aquele que tem esse poder e demonstra-o fazendo milagres e perdoando
os pecados, no mesmo tempo que expulsa os demônios; mas logo a seguir,
transmite este poder aos Doze, de modo que esse poder se perpetue na Igreja.
3.
Paixão e
Ressurreição de Jesus è
26,1-28,20. Mateus apresenta Jesus como o Filho de David, o
herdeiro do Reino (2 Samuel 7, 12-14), e também como o Emanuel (“Deus
conosco”), da profecia de Isaías (7, 14). No entanto, o título que mais lhe
interessa é o de Filho de Deus. A imagem de Cristo apresentada por Mateus é a
do enviado de Deus, na qual se vão cumprir todas as expectativas do Antigo
Testamento. Cristo é a realização de tudo o que fala o Antigo Testamento; dito
de outra maneira, Mateus contempla todos os personagens do Antigo Testamento
como figuras de Cristo, enquanto que Cristo é a realidade, na qual tudo se
cumpre. É como se tudo o que dizia a Sagrada Escritura até então, fosse algo
vazio que agora se enche, ou como um desenho que agora tem de se terminar de
pintar.
Mateus fala frequentemente do “Reino
de Deus”, ou do “Reino dos Céus”, dando preferência a esta última expressão,
sem fazer aparentemente distinção entre as duas formas. Os outros evangelistas,
ao contrário, usam mais a primeira. É notável a frequência com que Mateus se
refere ao Reino: enquanto Mateus refere-o 50 vezes, Marcos refere-o somente 14
e Lucas 39.
Deve-se recordar que a “Boa Nova”
consiste em Deus que vem reinar sobre o seu povo. O Reino dos Céus não é algo
que está exclusivamente do outro lado (no Céu), mas sim, que vem a este mundo:
Deus vem exercer a sua função de Rei, transformando tudo, tanto o mundo, como
os homens. O Reino dos Céus vem a este mundo, começa a ganhar forma na terra, e
terá a sua consumação nos Céus. São Mateus preocupa-se em mostrar que a boa
nova da chegada do Reino dos Céus dá-se na pessoa de Jesus Cristo. O Reino dos
Céus anunciado e preparado no Antigo Testamento já está presente em nós, porque
Jesus é o cumprimento de todas as profecias. Jesus forma uma comunidade, na
qual se começam a manifestar os sinais da presença do Reino. São Mateus é o
único evangelista que dá o nome de “Igreja” a esta comunidade (Mateus 16, 18).
DETALHES DO EVANGELHO DE
MATEUS
Autor: Mateus significa “dom de Deus” (Matatias, no hebraico) é um dos Doze Apóstolos. Foi
chamado enquanto estava sentado na sua banca, pois era cobrador de impostos
(9,9). Depois do chamado ofereceu um almoço para Jesus e seu grupo (9,10-13). É
o mesmo Levi de Lc 5,27 e era filho de Alfeu (Mc 2,14).
Local e data: Na Bíblia, é o primeiro Livro do NT (é o mais longo dos quatro
Evangelhos). A maioria dos autores hoje concorda que foi escrito no norte da
Galiléia; outros afirmam que foi na Síria (Antioquia). Foi escrito primeiro em
hebraico ou aramaico. Não temos mais o original. A data deve ter sido por volta
dos anos 80-90 dC. Seguramente depois que os romanos destruíram o Templo no ano
70, e quando os cristãos já não podiam mais freqüentar as sinagogas dos judeus.
Objetivo: O objetivo principal deste Evangelho é que Mateus quer responder a duas
perguntas, que com certeza os cristãos se colocavam depois da vida, morte e
ressurreição de Jesus:
- Quem é Jesus? (conhecer).
Jesus é o Emanuel, o Deus conosco, o Filho de Deus!;
- Como seguir Jesus Cristo? (fazer
o que Ele mandou). Mateus mesmo dá o exemplo. Jesus o chama: Segue-me! E ele, levantando-se, o
seguiu! (cf. 9,9).
Destinatários: Mateus escreve para os judeus que se converteram ao cristianismo, por
isso utiliza muito o AT e usa muitos termos hebraicos. Mas a mensagem de Jesus
é universal e por isso o Evangelho termina afirmando: “fazei que todas as nações se
tomem discípulos meus... (28,19).
CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS DO
EVANGELHO DE MATEUS
- 1,23: “Ele será chamado pelo nome de
Emanuel, que quer dizer: Deus está conosco”;
- 18,20: “Onde dois
ou mais estiverem reunidos em meu nome, eu estarei no meio de deles”;
- 28,20: “Eis que
estarei convosco todos os dias, até a consumação dos séculos”.
2. É o Evangelho do Pai:
Enquanto que em Marcos Jesus aparece
mais e é mais cristológico; em Lucas é o Espírito Santo que tem uma função
especial; em Mateus é a primeira pessoa da Santíssima Trindade que tem
destaque. Numerosas são as vezes em que Jesus fala de Deus como doPai nosso (21
vezes contra 5 de Lucas); o seu Pai (18
vezes, contra 6 de Lc e 3 de Mc). Passagens interessantes são: 10,29 (cf. Lc
12,6); 10,20 (cf. Lc 12,12); 20,23 (cf. Mc 10,40).
Algumas parábolas, que se encontram exclusivamente em Mateus, são verdadeiras
parábolas do “Pai”: a parábola do servo infiel (18,23-35, cf. v. 35), a
parábola dos trabalhadores na vinha (20,1-12), a parábola das bodas reais
(22,1-14; cf. Lc 14,16-24), a parábola dos dois filhos (21,28-31), a parábola
do joio e do trigo (13,24-30; cf v.27).
3. É o Evangelho da Justiça:
(3,15; 5,6; 10,20; 6,1.33; 21,32, etc.)
- Jesus nasce no ambiente de um homem justo (1,19);
- As primeiras palavras de Jesus
neste Evangelho são: “deixe como está, pois convém que cumpramos
toda a justiça” (3,15);
- A busca fundamental nossa deve ser
“o reino dos céus e sua justiça” (6,33);
- O julgamento de Deus será pela
justiça e misericórdia que praticamos (25,31-46).
- O tema da “recompensa” aparece
muitas vezes.
4. O projeto que Jesus anuncia
é uma Boa Notícia, chamado de Reino dos Céus:
- O tema do Reino “dos céus” (ou “de
Deus” – 5 vezes) aparece 54 vezes no Evangelho;
- Mateus prefere usar “reino dos
céus”, para evitar a expressão “reino de Deus”, pois os judeus, por respeito,
evitavam pronunciar o nome de Deus (YHWH – Javé).
- Jesus nasce da descendência do povo
hebreu. São 14 vezes três gerações (1,17). 14 é a soma das consoantes hebraicas
do nome David dwd (4 + 6 + 4 = 14). Jesus é três vezes Davi;
- Várias vezes encontramos “para se cumprir as Escrituras”, ou “o que foi dito pelos Profetas”; ou “também está escrito”; ou “ouviste o que foi dito aos
antigos”, etc.
6. As mulheres:
- Na genealogia de Jesus aparecem 5
mulheres. Isso era incomum no ambiente judaico. Todas têm problemas: Tamar que perdeu o marido e se
fez passar por prostituta (Gn 38);Raab é prostituta (Js 2,1-21); Rute é moabita, isto é, uma
estrangeira (Rt 1,4); Betsabéiaera mulher de Urias, que Davi mandou matar
para ficar com ela (2Sm 11 e 12); e Maria, que ainda não era casada com José;
- É uma mulher que unge Jesus e
prepara seu corpo para a sepultura (26,6-13);
- As mulheres são o grupo que é fiel até o fim
(27,55-56.61) e são as primeiras as receberem a boa notícia da ressurreição de
Jesus e serão as primeiras anunciadoras de que Jesus está vivo (28,1-10);
- Porém, a infância de Jesus é
contada na ótica de José e não de Maria, como em Lucas.
7. Aparecem fortes conflitos
com os judeus, principalmente com os fariseus:
O Evangelho foi escrito depois da
destruição de Jerusalém e do templo (70 dC). Era um momento de ruptura entre
judeus e cristãos. Era o tempo da reestruturação do judaísmo formativo. Os
cristãos nesta época eram expulsos das sinagogas, por isso Mateus fala das “suas/vossas sinagogas” ou “sinagogas deles”
(4,23; 9,35; 10,17; 12,9; 13,54; 23,34).
8. Evangelho das
Bem-aventuranças (Mt 5,1-12):
- São 7 ou 9, depende de como são
contadas;
- A recompensa na primeira (aos
pobres) e na sétima (aos perseguidos pela justiça) a promessa é no presente “deles é o reino dos céus”. As demais são no futuro: herdarão a terra; serão
saciados…;
- Diferente de Lucas, os “Ai de vós” não vêm em seguida aos “felizes / bem-aventurados vós”.
Eles aparecem no capítulo 23;
- Deus quer o povo feliz! E essa
felicidade começa logo para quem entra no Reino;
- Pessoas pobres, doentes,
endemoninhadas, famintas, cegas, desempregadas, crianças, mulheres, multidões…
Este é o povo que Jesus encontra e são as privilegiadas no anúncio do Reino.
9. Os números em Mateus:
Mateus usa muito os números,
sobretudo 3, 5, 7 e 10. Ex.: narra 3 tentações de Jesus; 3 “quando…” (6,2.5.16); 3 súplicas no monte das Oliveiras;
temos 3 negações de Pedro; 3 séries de 14 (7 x 2) gerações na genealogia de
Jesus. Encontramos 7 discursos de Jesus, 7 parábolas sobre o Reino;
- O Evangelho está organizado em 5
livrinhos (igual ao Pentateuco, no AT);
- Devemos perdoar não 7 vezes, mas
setenta vezes sete, isto é, infinitamente;
- Encontramos em Mateus 10 milagres
(igual às 10 pragas ou aos 10 Mandamentos no AT).
10. Jesus é o novo Moisés:
- A matança dos meninos (2,13-18)
recorda um fato semelhante com Moisés (Ex 1,15-22);
- Jesus é maior que Moisés, pois Ele
cumpre toda a Lei (5,17) e lhe dá uma nova interpretação (5,21-48;
19,3-9.16-21);
- Várias vezes, Jesus sobe à
montanha. Esta era o lugar privilegiado para o encontro com Deus. Jesus sobe à
Montanha (5,1), assim como Moisés foi ao Sinai. O sermão na Montanha (5-7) e o
envio dos Apóstolos pelo mundo (28,16-20) lembram as tábuas da Lei dadas a
Moisés no Monte Sinai.
11. O verbo “ver”:
- Jesus “viu” os primeiros Apóstolos
(4,18.21); “viu” Mateus (9,9); “viu” as multidões (5,1; 8,18; 9,36); “viu” a
sogra de Pedro de cama (8,14); “viu” a mulher doente (8,22); etC.
12. É o Evangelho da Igreja:
- Duas vezes aparece a palavra ekklesía: Igreja / Assembléia (16,18;
18,17);
- Mateus procura corrigir certos
problemas da comunidade: o perdão aos que erram, o bom comportamento (parábola
do semeador, todo o capítulo 18,
a questão da autoridade, o perdão etc.);
- Ele quer demonstrar que os cristãos
são o novo Povo de Deus e a Igreja é o verdadeiro Israel;
- O batismo substitui a circuncisão.
É o novo sinal de pertença ao povo de Deus;
- Foi o Evangelho mais usado na
Igreja primitiva. Seu estilo é de Catequese.
Frei
Ildo Perondi – ildo@sercomtel.com.br
Ildo
Perondi é Frei Capuchinho, nascido em Romelândia (SC), com Mestrado em Teologia Bíblica
pela Universidade Urbaniana de Roma. É Professor de Sagradas Escrituras na
PUC-PR (Campus Londrina) e no Instituto Teológico Divino Mestre de Jacarezinho
(PR). Assessor Bíblico da CRB, CEBI, CEBs e Escolas Bíblicas para leigos.
BIBLIOGRAFIA:
CNBB. Ele está no meio de nós, Paulus (1998, São Paulo)
MOSCONI, L. O Evangelho de Mateus. CEBI (1990, São Leopoldo)
STORNIOLO, I. Como ler o Evangelho de Mateus,
Paulus (1990, São Paulo)
Introdução ao Evangelho de Mateus da
Bíblia de Jerusalém, Edição Pastoral e Bíblia do Peregrino.
* Neste texto, todas as citações onde
não aparece o nome do livro da Bíblia, são do Evangelho de Mateus.
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