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segunda-feira, 28 de julho de 2014

CATEQUESE DE INSPIRAÇÃO CATECUMENAL - A catequese e a iniciação à vida Cristã:

A catequese e a iniciação à vida Cristã:

Mais uma vez Ir. Nery nos brinda com informações sobre um processo que pouco a pouco vem tomando forma em nossas paróquias: a Iniciação à Vida Cristã pelo Processo Catecumenal. Processo esse, usado pela Igreja nos primeiros séculos do Cristianismo e que pede uma retomada urgente na catequese dos dias de hoje.


CATEQUESE DE INSPIRAÇÃO CATECUMENAL
Entrevista com o Irmão Israel Nery fsc


Ângela Rocha. Ir. Nery temos aqui mais um tema... É sobre a aplicação prática do itinerário catequético de inspiração catecumenal. Vejo tanta diversidade de interpretação e de colocação do processo em prática...


Irmão Nery: Apesar do Concílio Vaticano II ter solicitado, há quase 50 anos atrás, que a Igreja retomasse, no processo de educação dos fiéis (na fé, na esperança e no amor), o Itinerário Catecumenal (dos século III ao V), considerado período áureo da Catequese, temos de reconhecer que aqui no Brasil isso está apenas no começo. As orientações do Concílio sobre este assunto e a aplicação litúrgica do Catecumenato (no Ritual de Iniciação Cristã de Adultos - RICA, 1972), entrou no interesse da Igreja e, particularmente da Catequese, apenas a partir de 2000, quando aconteceu a mobilização nacional e a Segunda Semana Brasileira de Catequese, que aconteceu em 2001, sobre Catequese com Adultos. Mas, insisto em três questões, para iniciar nosso diálogo: a) a retomada, mas de modo adaptado, do itinerário catecumenal; b) o sentido amplo de inspiração catecumenal; d) e o RICA, que é um ritual litúrgico.


Ângela Rocha: Por favor, explique um pouco mais esta retomada do Catecumenato, solicitada pelo Concílio, e, também, se esta retomada é mesmo tarefa da Catequese.


Irmão Nery: Escolho apenas três orientações do Concílio Vaticano II e uma do Catecismo da Igreja Católica para elucidar esta questão. A primeira é da Constituição dogmática “Sacrossanctum Concilium”, que é sobre Liturgia: Restaure-se o Catecumenato de Adultos, dividido em diversas etapas, introduzindo o uso de acordo com o parecer do Ordinário do lugar. Desta maneira, o Tempo do Catecumenato, estabelecido para a conveniente instrução, poderá ser santificado com os sagrados ritos a serem celebramos em tempos sucessivos (SC, 64). Está claro na SC que o Catecumenato, visto sobre o ângulo da Liturgia, exige Catequese considerada como um “tempo para a conveniente instrução”.

O segundo texto é do Decreto Conciliar “Ad Gentes” que chega a dar elementos importantes sobre a definição de Catecumenato: O catecumenato não é uma mera exposição de dogmas e preceitos, mas uma educação de toda a vida cristã e um tirocínio de certa duração, com o fim de unir os discípulos com Cristo, seu mestre. Sejam os catecúmenos convenientemente iniciados no mistério da salvação.” (AG 14).

E o Concílio é claro, quanto à responsabilidade eclesial com relação ao Catecumenato. Eis o terceiro texto: A iniciação cristã no Catecumenato não é apenas tarefa dos catequistas e sacerdotes, mas de toda a Comunidade dos fiéis, de modo especial, dos Padrinhos. (AG, 14). Concluo esta fundamentação em documentos da Igreja, com a seguinte orientação síntese dada pelo Catecismo da Igreja Católica, 1248: O catecumenato, ou formação dos catecúmenos, tem por finalidade permitir a estes últimos, em resposta à iniciativa divina e em união com uma comunidade eclesial, que levem a conversão e a fé à maturidade. Trata-se de uma "formação à vida cristã integral (...) pela qual os discípulos são unidos a Cristo, seu mestre. Por isso, os catecúmenos devem ser iniciados (...) nos mistérios da salvação e na prática de uma vida evangélica, e introduzidos, mediante ritos sagrados celebrados em épocas sucessivas, na vida da fé, da liturgia e da caridade do povo de Deus.


Ângela Rocha: Mas, na verdade o Concílio fala apenas, ou, sobretudo, da Catequese com Adultos quando se refere ao Catecumenato e ao RICA.


Irmão Nery. Para entender isto, é preciso recordar que, por mais que, na catequese, estejamos dando mais atenção às crianças, na verdade, para a Igreja, desde os seus primórdios, a prioridade das prioridades na evangelização, na catequese, na liturgia e na vida cristã prática, são os Adultos. O Concílio Vaticano II, fiel a esta tradição e levando em conta a importância da boa formação dos adultos, pede, portanto, que se restaure o Catecumenato de Adultos (SC 64), como a mediação que melhor atende a esta finalidade. Logo depois do Concílio, quase que ao mesmo tempo em que o RICA, a Igreja, executando a recomendação do Decreto Christus Dominus, 44, (sobre a missão do Bispo), publica em 1971, o “Diretório Catequético Geral” (DCG), que nos itens 20 e depois 92 a 97, ao falar da Catequese com Adultos diz: Lembre-se também os párocos que a Catequese de Adultos, sendo dirigida a pessoas capazes de uma adesão plenamente responsável, deve ser considerada como a principal forma de catequese, à qual todas as outras formas, certamente sempre necessárias, de alguma forma se subordinam. Por sua vez o Congresso Internacional de Catequese, promovido pela Sé Apostólica, em Roma, em 1971, insiste nesta prioridade a falar da catequese com as crianças: É necessário prestar crescente atenção à catequese de adultos e reconhecer que a catequese das crianças depende mais que nunca da fé dos adultos. Os adultos e a família requerem uma prioridade catequética. A catequese de adultos é a forma plena da catequese. As outras formas remetem a ela... O testemunho da comunidade de adultos é fonte e fim da catequese. (cf. IRMÃO NERY: Catequese com adultos e catecumenato, pg. 85). Uma conseqüência lógica seria que, em todas as paróquias e dioceses, se coloque a catequese com adultos como prioridade e que junto com toda catequese com crianças, adolescentes e jovens, se faça a catequese com os pais e padrinhos destes catequizandos (filhos e afilhados), numa organização concomitante com a catequese com adultos. É, a tarefa é complexa e estamos ainda longe do que, há mais de 40 anos, a Igreja vem propondo. O importante é que tentemos.


Ângela Rocha: E como fica, então, o Catecumenato para a Catequese, tanto de Adultos como de crianças e de jovens?


Irmão Nery: Acima de tudo não pode ser “remendo de pano novo em roupa velha”, isto é, apenas mudar o rótulo dizendo que é “Iniciação à vida cristã” ou que é de “estilo catecumenal”, quando, na verdade, mantem-se o mesmo esquemão tradicional, tanto de conteúdo como de metodologia e, finalização ao estilo escolar de “cursinho vestibular para receber sacramentos” (Primeira Comunhão, Confirmação, Matrimônio, Batismo...), na maior parte das vezes mais “ato social” do que celebração de fé. Mas é preciso deixar claro também que para mudar é preciso um “novo tipo de catequista”, que tenha vivenciado intensamente o estilo da catequese de inspiração catecumenal, caso contrário continuaremos fazendo tudo igual, apenas com nome diferente. Uma das necessidades principais e mais urgentes é que, sobretudo, bispos, padres e coordenadores de pastoral, além dos catequistas, passem por este processo renovador. Isso é sério porque os catequistas que se renovam podem não ser apoiados e até mesmo barrados pelos padres e coordenadores, que não estiverem em sintonia com a orientação da Igreja quanto ao itinerário catecumenal.


Ângela Rocha: Em quanto aos livros, cadernos ou manuais recentes para a Catequese?


Irmão Nery: Não é nada fácil escrever subsídios catequéticos que sejam realmente de inspiração catecumenal, isto é, que tenham como meta a iniciação à vida cristã. Por muito tempo ainda – tomara que eu esteja errado -, nossa catequese no Brasil vai ficar muito atrelada à preparação para os sacramentos e bem no estilo de sacramentalização. A maioria das novas coleções para a catequese, na verdade, realizam a operação do rótulo, mantendo o tradicional. Incluem algumas celebrações do RICA, o que até podem banalizar estas ricas celebrações, porque correm o risco de serem realizadas no estilo tradicional burocrático, ritualista e frio que predomina nas celebrações de nossa Igreja e ainda podem ficar repetitivos, pois são feitas na preparação à Primeira Eucaristia e depois na preparação da Confirmação. Pode até acontecer que estes subsídios estejam sendo oferecidos como uma transição suave para a introdução aos poucos da iniciação à vida cristã e que os autores, em breve, venham a produzir materiais mais ajustados ao itinerário catecumenal.


Ângela Rocha: É necessário seguir, neste itinerário catecumenal, os clássicos 04 tempos ou 5 tempos e as 3 Etapas?


Irmão Nery: Muitos padres, coordenadores e catequistas ainda desconhecem o RICA, um livro de Rituais, que traz apenas as 03 Etapas, que são Celebrações de transição de um Tempo para outro, menos a terceira que tem um significado muito próprio por ser a Vigília Pascal. O RICA traz também outras celebrações correspondentes aos diversos ritos que fazem parte do itinerário catecumenal. Ainda há, entre padres, coordenadores de pastoral e catequistas, resistência ao Catecumenato e há os que o confundem com o Caminho Neo-catecumenal, que é um grupo ou movimento com estrutura rígida, organização mundial, lideranças específicas e um modo próprio de entender e realizar o Catecumenato. Isso, sem dúvida, tem dificultado bastante que a iniciação à vida cristã, tenha recebido o apoio de que precisa para acontecer. Quanto aos Tempos e Etapas. Ainda há confusão com estes dois termos, pois não estão em uso desde o século V. Foram recuperados pelo RICA, que não teve vez no Brasil. “Etapa” já expliquei no parágrafo anterior e se refere à celebração litúrgica de transição de um Tempo para outro. “Tempo” é a fase de meses ou anos dedicadas à formação humana e cristã dos que pedem para ser batizados ou que, tendo sido batizados, não tiveram uma boa iniciação à vida cristã e precisam enriquecê-la, completá-la.


Ângela Rocha: Não seria conveniente nesta nossa fala, você nos dar um resumo do essencial de cada Tempo do itinerário catecumenal?


Irmão Nery: Sim, posso fazê-lo, apesar de haver, sobre o assunto, vários livros, artigos, folhetos, como por exemplo, o Estudo da CNBB n.º 97 - “Iniciação à Vida Crista”.
O Primeiro Tempo (Kerigma) é dedicado tanto à Interação grupal para criar confiança mútua entre os participantes, formar grupo e, sobretudo, comunidade; e é dedicado também e principalmente ao anúncio primeiro e vibrante de Jesus Cristo (ou Kerigma) para ajudar cada pessoa pessoas a assumir para valer Jesus Cristo (encontro pessoal e intransferível com Jesus Cristo) e vivenciar o processo de conversão para se transformar em discípulos missionários dele consciente, esclarecido, coerente e generoso. Não há duração recomendada para este Tempo. A pessoa, denominada de “Introdutor/a”, encarregada de fazer acontecer este Tempo e os próprios participantes do mesmo fazem a avaliação e decidem sobre a passagem para o Segundo Tempo, o da catequese propriamente dita ou catecumenato. No final acontece a Celebração ou Etapa de transição para o Tempo seguinte (Ver no RICA).

O Segundo Tempo (Catecumenato): É o mais longo e denso no itinerário catecumenal. É o período dedicado à catequese propriamente dita, para se conseguir de modo harmonioso e abrangente, uma boa síntese dos principais conteúdos da fé cristão, segundo o modo católico de entendê-los e vivenciá-los. Mas esta catequese (ou Tempo específico de catecumenato. O termo vem de catequese, “fazer ecoar e ressoar” dentro da pessoa em seu comportamento, a conversão e a mensagem do Evangelho). Para isso é preciso evitar o estilo “escolar, de aulinha”, mas adotar o “estilo kerigmático, isto é, fraterno, comunitário, orante, celebrativo, meditativo, confrontador com a vida pessoal e social, em sentido de comunhão eclesial e missionário. Há durante este Tempo de Catecumenato ou Catequese, ritos e celebrações importantes. No final há a Celebração ou Etapa, que faz a transição para o Tempo seguinte (Ver no RICA)

O Terceiro Tempo (Purificação e Iluminação). É a última Quaresma do processo, que passa a ser vivida como uma espécie de “grande retiro de 40 dias” em preparação da Páscoa. Há uma intensa atividade em vista de se assimilar a ética do evangelho, a moral cristã, o sentido de pecado e de perdão-reconciliação. Mas é um tempo dedicado a um re-estudo orante dos Sacramentos, especialmente os da iniciação cristã (Batismo, Confirmação e Eucaristia) e também do Mistério Pascal. Há ritos importantes e muito significativos a serem realizados, especialmente no sábado santo pela manhã e uma boa meditação sobre os textos e os ritos da Vigília Pascal. A Celebração ou Etapa 3 é a própria Vigília Pascal – Ver no RICA e no Missal)

O Quarto tempo (Mistagogia). É um Tempo privilegiado, no período pós-pascal para um mergulho mais intenso nos “segredos” (mistérios) da fé cristã. O termo “mistagogia” é formado por duas palavras gregas: a) mistério (resumido em “mista”); b) agog (gruía, condutor, orientador), portanto, Mistagogia significa “conduzir, guiar para dentro do mistério, dos segredos de Deus. Nos séculos III ao V, muitos bispos reservavam para si este Tempo e algumas “Catequeses Mistagógicas” foram conservadas na literatura cristã, entre as quais, se destacam as de São Cirilo de Jerusalém. Não há uma Celebração ou Etapa para uma transição para um outro Tempo, porque, segundo a organização catecumenal, o fiel já passava a ser considerado suficientemente iniciado, cabendo-lhe continuar o processo formativo como membro pleno da Comunidade Cristã, responsável por si, pela Igreja e pela Missão.


Ângela Rocha. É preciso seguir rigorosamente estes Tempos e Etapas? Há outra modalidade de se fazer a Iniciação à Vida Cristã?A gente sabe que há lugares em que se faz “iniciação à vida cristã”, mas sem seguir rigorosamente este esquema.


Irmão Nery: Os livros que informam sobre o Catecumenato histórico dos séculos III ao V e o RICA, evidentemente apresentam os 04 Tempos e as 03 Etapas ou Celebrações, mais os diversos Ritos a serem realizados ao longo do processo. Esta é uma das modalidades, recomendável para organizar iniciativas para a Formação Iniciática de Catequistas, pois ao mesmo tempo em que o itinerário catecumenal é ensinado e aprendido, mais que isso, ele é experienciado pelos catequistas. É aconselhável também para a Catequese com Adultos e mesmo com jovens. Mas, neste período de transição em que estamos, da passagem do estilo tradicional de catequese para a “catequese de inspiração catecumenal”, é preciso calma, paciência, adequação, mudanças aos poucos, sempre acompanhadas de explicações, orientações para se evitar perda de tempo e de energias com discussões estéreis.


Relembro que o essencial na chamada “inspiração catecumenal” está “no jeito kerigmático”, com que se deve fazer tudo na Igreja, isto é, “centralizar no encontro pessoal com Jesus Cristo e na conversão”. Está comprovado que a catequese de mero “ensino” e “sacramentalização” e, a liturgia de mera “leitura fria e burocrática de Rituais” não funcionam mais. Mas aqui desejo fazer uma observação importante. Quando se começa o processo de implantação da catequese catecumenal, precisa-se imitar Jesus Cristo. Se esvaziar, humilhar-se, ouvir, ler, consultar, observar, inculturar-se aos poucos, respeitar as particularidades de cada diocese. Não se pode comparar uma diocese com outra, pois cada qual tem sua caminhada. Quem contesta as mudanças querendo impor seus pontos de vista destrói a unidade da Igreja e cria animosidade. A humildade e a capacidade de escuta são vitais para todos nós discípulos missionários de Jesus Cristo, leigos, leigas, religiosos, religiosas, líderes, ministros, ministras, padres, bispos.


Ângela Rocha: Voltando aos Tempos e Etapas, existe um possível Quinto Tempo e mais alguma Etapa no itinerário catecumenal?


Irmão Nery: Historicamente, pelo que sei, não existiu, mas nada impede que sejam criados, se a realidade apontar que seriam úteis no processo educativo da fé, da esperança e da caridade. Em alguns cursos e assessorias tenho proposto um quinto tempo, que seria, a meu ver, a partir da realidade dos católicos no Brasil e dos últimos documentos da Igreja, de grande importância, para se trabalhar os seguintes temas:a) orientações para a Formação Permanente;b) Vocações e ministérios na Igreja;c) Projeto pessoal de vida à luz da fé;d) estágios acompanhados em diferentes pastorais;e) experiências missionárias de fronteira, isto é, em lugares ou situações maior exigência. Mas é a realidade de cada lugar e a capacidade de escuta dos sinais dos tempos, das necessidades de uma formação cada vez mais exigente, num mundo plural, agressivo e esvaziador como o atual, que vão fazer perceber a oportunidade e necessidade de mais Tempos e Etapas no itinerário catecumenal, adaptado e inculturado ao hoje de nossa história.


Aproveito a oportunidade desta entrevista para saudar a quem estiver lendo e, ao mesmo tempo, solicitar ajuda para que este texto seja aperfeiçoado e enriquecido em benefício da renovação da catequese e de toda a nossa Igreja.


Ângela Rocha: Obrigado Ir. Nery, acredito que suas palavras serão aproveitadas ao máximo por todos os catequistas que estão aplicando o processo catecumenal em suas paróquias e por aqueles que ainda virão aplicar.

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