O Dia de Finados é rico para avaliar o sentido de nossa vida e o rumo e prumo que damos ao nosso itinerário. Não é a vida que dá sentido à morte, mas a morte que dá sentido e valor à vida.
*Gerson Schmidt
A
sociedade ocidental rejeita constantemente a morte procurando vencê-la,
retardando-a o quanto possível, esticando a vida até o máximo. O homem sempre
aspirou à imortalidade. A tentativa de vencer ou de no mínimo contornar a morte
levou a centenas de esforços humanos, incansáveis e um tanto inúteis. A morte
sempre foi imperiosa, abraçando suas vítimas. Pode tardar, mas não falha. Em
hora certamente incerta, é a coisa mais certa. Cada um de nós carrega a
possibilidade de, a qualquer momento, não ser mais possível. Existimos com essa
potência irreversível e irremediável: a nossa não-existência. Heidegger,
filósofo existencialista, caracterizou o homem como ser-para-a-morte. De fato,
estamos fadados a morrer. Não há outra saída.
O
ser humano, em seu desejo de sobreviver, passa a vida temendo ou desejando a
morte. Na maioria das vezes, há o medo do desconhecido, a dúvida sobre a
descontinuidade da existência, a incerteza de como será o ainda-não. E, nesse
caso, a morte vem com assombro, angústia, desespero. Em outros casos, há uma
resignação, aceitação, ou até mesmo regozijo, quando há certeza do vivido e
daquilo que será o que está por vir. É o caso de mártires, sábios e santos. São
Francisco chamou seu passamento de “irmã morte”.
Sêneca
dizia que o homem vive preocupado em viver muito e não em viver bem, quando não
depende dele viver muito, mas viver bem. O filósofo Epicuro chamou de tolice a
aflição com a espera da morte, pois enquanto vivemos, ela não existe, e quando
ela chega, nós não existiremos mais. A Bíblia Sagrada aponta a mortalidade do
homem em tom derradeiro: “Lembra-te que és pó e em pó te tornarás” (Salmo 8,4).
Mas, em tantos trechos, destaca a ressurreição dos mortos como essência da fé
cristã. Para os cristãos, não se nasce para morrer, mas se morre para
ressuscitar.
Quem
não pensa e prepara sua morte, acaba descomprometendo-se com a vida. Quem não
sabe aonde chegar, não fazendo o planejamento de seu fim, não organiza sua
caminhada desde o início. O fim depende do começo e do meio. Mas sempre há
chance de reverter nosso descaminho. Quanto mais torto, mas difícil é
endireitá-lo no final.
A
nossa finitude nos dá a capacidade de qualificar nossa vida. A eternidade do
amanhã dependerá da plenitude do hoje. É a certeza de que findaremos um dia que
nos faz acordados no presente. Por isso, este dia de finados é rico para
avaliar o sentido de nossa vida e o rumo e prumo que damos ao nosso itinerário.
Não é a vida que dá sentido à morte, mas a morte que dá sentido e valor à vida.
* Padre Gerson Schmidt é da Arquidiocese de Porto Alegre –
RS.
(2008).
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