Quando falamos em "Festa de Santo...", há quem critique a Igreja pelo "reforço" que se dá ao que chamamos "piedade popular". Mas, ao falar de religiosidade popular, não podemos ignorar a força dos santos na vida de nossa gente e o lugar de destaque que eles ganharam na Igreja Católica. O que não podemos negar é que sem a Religiosidade popular, a igreja não se sustenta. A partir dessa compreensão, a afirmação “a igreja é o povo de Deus”, hoje tão controvertida, um dia será aceita como uma evidência. É o povo com suas crenças, a força da sua fé e seus símbolos, que torna na nossa Igreja tão rica e que tem perpetuado o catolicismo na história.
RELIGIOSIDADE POPULAR
Pe. Jakson Ferreira de Alencar, ssp
Com frequência vemos a
religiosidade popular ser classificada como algo menor, como “sincretismo”,
invencionice, coisas exóticas, obscurantismo ou mero conjunto de curiosidades.
Mas na fé do povo há um tesouro inestimável ao qual convém prestar atenção.
Geralmente, credita-se a enorme e
rápida expansão do cristianismo nos primeiros séculos às formulações
teológicas, ao grande heroísmo de alguns cristãos, à atuação de algumas
lideranças proeminentes. Sem dúvida isso foi importante, mas, como nos mostra
com muita eloquência em seu artigo o teólogo Eduardo Hoonaert, tal expansão se
deu muito mais pela fé popular e pela atuação cristã nas bases da sociedade.
Pesquisas arqueológicas demonstram que a religiosidade popular e a capacidade
do cristianismo de dialogar com as pessoas das classes mais baixas é que
permitiram que Cristo fosse tomando o lugar de divindades reinantes no
imaginário daquele tempo, como Asclépio, a quem a população recorria para a
solução de seus problemas (doença, marginalização, morte). Da mesma forma,
Maria superou a deusa Ísis, cuja imagem a apresentava com o filho nos braços e
que era cultuada como mãe de deus, a mãe carinhosa que protege as pessoas.
Somente após muita relutância, no século IV, no Concílio de Niceia, aceitou-se
oficializar o título de Maria como Mãe de Deus, o qual o povo teimava em
atribuir-lhe.
Com isso se percebe o quanto é
difícil, senão impossível, dizer o que é sincrético e o que é puro. Mesmo o que
hoje é considerado a mais pura ortodoxia está atravessado riqueza da
diversidade cultural do povo. Quem estuda a Bíblia um pouco mais a fundo sabe
que até nos livros mais antigos há elementos recebidos das culturas e religiões
dos povos vizinhos. De igual modo, se as congadas brasileiras são consideradas
sincréticas, também o podem ser muitas de nossas formas religiosas oficiais,
pois são imbuídas de diálogos e trocas culturais firmadas pelo cristianismo ao
longo dos séculos. É inegável, por exemplo, a influência da cultura europeia em
muitos aspectos do cristianismo, até mesmo nas vestes litúrgicas. Toda
religião, como toda cultura, constitui fenômeno vivo, dinâmico, que não tem
como ser isolado numa visão única, separada, cartesiana, intelectualizada e
petrificadora. Fazer isso seria empobrecer a realidade.
A Igreja, como está configurada,
foi, em grande parte, constituída pela religiosidade popular e se mantém graças
a ela. Abrir-nos humildemente a essa enorme contribuição do povo não significa
aceitar e endossar toda forma de religiosidade de maneira populista, mas
aprender com quem poderíamos achar que não tem nada a ensinar. Trata-se de
saber dialogar com o imaginário do povo e com seus sistemas simbólicos,
encontrando neles o que há de profundamente evangélico; procurar o sagrado vivo
e presente na fé do povo e estar dispostos a aprimorar o que porventura não
seja evangélico. Não é nenhum favor fazer isso, ao contrário: é a fé do povo
que nos presta favor, ajudando a relativizar cientificismos, intelectualismos,
eurocentrismos, teologias e liturgias frias ou tendentes a se distanciar da
realidade.
Pe. Jakson Ferreira de Alencar, ssp - Revista Vida Pastoral –
Paulus – 2013.
Convidamos você a conhecer mais sobre a "Religiosidade Popular", lendo a edição completa da Revista VIDA PASTORAL de março/abril de 2013:
http://www.vidapastoral.com.br/wp-content/uploads/2013/02/mar%C3%A7o-abril-de-2013.pdfhttp://www.vidapastoral.com.br/wp-content/uploads/2013/02/mar%C3%A7o-abril-de-2013.pdf
Nenhum comentário:
Postar um comentário