Por mais ilógico que isso pareça, não é
absurdo, exagero ou crueldade. Não conheço a paróquia em questão e nem os
itinerários utilizados, mas, a prática parece de acordo com o processo catecumenal de
evangelização. E pode não ser coisa do Espírito Santo, mas, foi de São Justino,
Santo Hipólito, Santo Ambrósio, Santo Agostinho e vários outros Santos Padres
da nossa Igreja. Esta era uma prática da Missa nos primeiros séculos da nossa
Igreja, que deixou de ser feita lá pelo século IV, mais ou menos quando o batismo
de crianças se tornou uma prática constante.
O que temos visto em alguns lugares, é que se tem procurado adaptar o processo catecumenal aos dias de hoje, utilizando-se práticas um pouco diferentes da que estamos acostumados. E precisamos conhecer todos os lados.
Muito se tem absorvido da IVC utilizando-se ritos e celebrações do RICA – Ritual de Iniciação Cristã de Adultos - livro Litúrgico da Sagrada Congregação para o Clero (Santa Sé) que disciplina a iniciação de adulto à vida cristã - que jamais pode ser absorvido como um todo, ele precisa ser adaptado à Igreja do século XXI com todos os problemas que ela vive hoje, se é que isso é possível.
Agora vamos lembrar um pouco da nossa história para entender!
A missa é uma prática relatada desde o primeiro século da nossa Igreja, claro que não da forma como a conhecemos. Quem conhece o Didaquê? Então, Didaquê é o nome das primeiras catequeses dos discípulos de Jesus (Temos o documento na íntegra em nosso blog se alguém quer conhecer). Pois bem, o Didaquê recita a missa em seu catecismo nº XIV e também podemos ver uma "missa" em Atos 2, na doutrina dos apóstolos, em Atos 20 e também na 1ª Carta aos Coríntios 10 e 11.
Mas, onde quero chegar?
Que a "missa" existe praticamente desde a morte de Jesus, não da forma como a conhecemos lógico. Ela foi mudando ao longo do tempo. Encontramos nos escritos de São Justino no século II e Santo Hipólito, aliás é dele a primeira Oração Eucarística, e as descrições da missa, sua ordem, a ordem dos ritos, etc.
Agora vamos a ORIGEM da própria palavra MISSA.
A palavra missa vem de "missio" que significa missão, envio, ou seja, uma despedida.
E onde ocorria a primeira "despedida" nas celebrações antigas? Justamente na "despedida dos catecúmenos", na saída daqueles que ainda não tinham recebido os sacramentos. Isso era feito logo após a homilia ou sermão.
Naquela época não era permitido aos catecúmenos participar da oração eucarística porque eles ainda não estavam "prontos", preparados para receber a Eucaristia. Aliás, não eram só eles que eram "despedidos" no meio da missa, os "penitentes" também eram. Saiam e as portas eram, inclusive, fechadas para que eles não soubessem o que acontecia no rito dali para frente.
E vocês pensam que comungar era tão fácil como é hoje? Não era não!
Se você fosse um pecador (penitente) em arrependimento passava por longo processo até receber a reconciliação. E, se a recebia, e pecava novamente, nunca mais era admitido na Eucaristia! Algumas pessoas chegavam a viver um catecumenato permanente, não podendo comungar, de medo de voltar ao pecado e então não poder passar pelo processo novamente.
Então o nome "missa" vem da despedida dos catecúmenos, que designava tal momento da missa. Lá pelo século IV que o termo passou e a ser aplicado a todo rito eucarístico, de modo que este passou a ser chamado de MISSA integralmente.
Vejam só que ironia: foi a "despedida" no meio da missa, daqueles que não podiam comungar, que deu o nome a ela!
Mas, como eu disse a missa foi mudando ao longo do tempo. Só para vocês terem uma ideia, a missa já chegou a ter SEIS leituras. E antes da reforma atual, terminava a Eucaristia, seguia-se a bênção, se rezava o último Evangelho (prólogo de S. João), rezava-se três Ave Marias, duas orações e a invocação ao Coração de Jesus, para, só então o padre dar a bênção final e a despedida.
Portanto, a "despedida dos catecúmenos" subsistiu durante quase quatro séculos na Igreja. Pelos escritos de São Justino e São Clemente vemos a descrição desta despedida após o Credo ou após a Oração dos Fiéis, que só aparece mesmo no século V, antes era apenas uma oração pela Igreja e pelos fiéis que só o bispo fazia.
Por falar em Credo, naquela época só podia recitar o Credo quem já estivesse admitido para receber os sacramentos e tivesse recebido a oração no ritual. Quem ainda não tinha passado pelo rito, só podia escutar de boquinha fechada.
Mas, como eu disse, essa prática da
despedida foi cessando à medida que se passou a batizar crianças. Isso depois
que vários doutores da Igreja começaram a defender a tese do pecado original na
concepção. Quase a totalidade das pessoas no final do século IV e V já
eram cristãs, logo não havia mais o catecumenato como iniciação cristã, e as
práticas dele foram morrendo. A fé cristã era passada pelas famílias às
crianças e não se via mais a necessidade de uma catequese com adultos. A ideia
era a de que TODOS já eram cristãos desde a barriga da mãe, faltava então,
batizar com a "água do Espirito" para livrá-los do pecado original.
Mas, o mundo mudou novamente. E eu nem preciso dizer para vocês como e onde. Vivemos esta realidade hoje na catequese. Que família é catequizada e catequiza os filhos? Poucas na verdade. Então a Igreja sente a necessidade de se voltar a atenção aos adultos novamente, já muitos foram “catequizados”, receberam os sacramentos da iniciação, no entanto, não estão evangelizados.
No final do século XIX e começo do XX a Igreja percebeu que precisava mudar, renovar-se. E aconteceu o Concílio Vaticano II, onde, entre outras coisas, pediu-se a volta do processo CATECUMENAL, que, em sua essência, catequiza adultos e não crianças.
Mas, a nossa cabecinha não pensa catequese como INICIÁTICA (de iniciação) e sim, como SACRAMENTAL, ou seja, se eu falar para vocês que precisamos fazer catequese com os adultos, qual a primeira dúvida que vem na cabeça? “Mas, e os sacramentos? E se ele já é batizado? Se já comunga? ”.
Nós fizemos, nestes séculos todos que se passaram, que os sacramentos passassem de uma "parte do processo", a OBJETIVO da catequese. Então se a pessoa já recebeu sacramento, para que catequese? Não é assim que a gente pensa? E não importa se o sujeito sabe ou conhece o rito, vive o rito, sente o rito; importa que ele pode entrar na fila para receber a comunhão. Não é assim? Não é assim que queremos "doutrinar" nossos pequenos desde cedo? Para que eles "aprendam" como entrar na fila e não fazer feio? Que eles saibam o que está acontecendo e ENTREM VERDADEIRAMENTE na MISTAGOGIA da fé, é coisa secundária.
Agora vamos a este caso específico de se estar retirando a criançada no meio da missa e, de repente, ficar um vácuo de bancos no meio da Igreja, parar o rito e tudo mais.
Primeiro: existe um RITUAL de despedida, com bênção e tudo mais, inclusive descrito pelo RICA itens 96, 160 e outros. Não é, simplesmente, as catequistas arrancarem as crianças dos bancos e levarem para outra sala.
Segundo: estas crianças nem deviam estar lá! Por que fazemos catequese com crianças que deviam estar sendo catequizadas pelos pais? Estas crianças podem, evidentemente, estar na missa sim! Sentadinhos com sua família, aprendendo COM ELA, o silêncio, a contemplação, a oração.
Parece aqui que, equivocadamente está se usando um RITO antigo, “Despedida dos catecúmenos”, com quem nem é catecúmeno; usando razões psicopedagógicas, ou seja, a criança de hoje em dia não se concentra na missa, não consegue prestar atenção em nada. Bom, se esta é a explicação, ela é bem furada. Por que se faz pré-catequese com ela então? Que pré-catequese é essa? Ela não precisa se concentrar? Prestar atenção?
Agora a derrocada final: Fazer iniciação a vida cristã com criança? Sem ter feito antes com as catequistas delas? Com os pais delas? No final das contas, não está entendendo nada quem manda e nem quem obedece. Primeiramente, os catequistas deveriam entender o que está acontecendo, depois os pais e as crianças. A comunidade então, deve estar completamente “vendida” nesse processo todo!
Estamos andando na contramão faz tempo. Estamos tentando evangelizar crianças para ver se elas evangelizam os pais. Pode acontecer é claro, mas, qual é realmente a probabilidade de que isso aconteça?
Muitas paróquias estão tentando
estabelecer o processo catecumenal, mas estão com a "clientela"
errada. Fosse eu, acabava com a pré-catequese, começava uma catequese com a
família e ensinava todos a participar da missa.
Ângela Rocha - Catequista
Graduada em teologia pela PUCPR.
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