O Dia Mundial das Comunicações Sociais é celebrado desde 1966 no domingo anterior à festa do Pentecostes, na Festa da Ascensão do Senhor, que este ano será no dia 8 de maio.
“Comunicação e Misericórdia: um encontro fecundo" é a mensagem do Papa Francisco para o 50º Dia Mundial das Comunicações Sociais. Nela Francisco convida a Igreja a rejeitar palavras e gestos “duros ou moralistas”, que correm o risco de afastar ainda mais as pessoas.
“Podemos e devemos julgar situações de pecado – violência, corrupção, exploração, etc. –, mas não podemos julgar as pessoas, porque só Deus pode ler profundamente no coração delas. É nosso dever admoestar quem erra, denunciando a maldade e a injustiça de certos comportamentos, a fim de libertar as vítimas e levantar quem caiu”, explica.
A celebração de 2016 é colocada no contexto do ano santo extraordinário (dezembro de 2015-novembro de 2016), o Jubileu da Misericórdia convocado pelo Papa.
“Alguns pensam que uma visão da sociedade enraizada na misericórdia é injustificadamente idealista ou excessivamente indulgente”, admite Francisco, que responde a estas críticas com a vida familiar e a atitude dos pais para com os filhos.
“Gostaria de encorajar todos a pensar a sociedade humana não como um espaço onde estranhos competem e procuram prevalecer, mas antes como uma casa ou uma família onde a porta está sempre aberta e se procura aceitar uns aos outros”, acrescenta.
Francisco refere que é “fundamental escutar” para fazer da comunicação uma verdadeira partilha, distinguindo esta atitude do simples “ouvir”, porque ultrapassa o âmbito da informação e “requer a proximidade”, admitindo que “escutar nunca é fácil”.
“O amor, por sua natureza, é comunicação: leva a abrir-se, não se isolando. E, se o nosso coração e os nossos gestos forem animados pela caridade, pelo amor divino, a nossa comunicação será portadora da força de Deus”, sublinha Francisco.
Nesse sentido, deixa um convite a “todas as pessoas de boa vontade” para que redescubram “o poder que a misericórdia tem de curar as relações dilaceradas e restaurar a paz e a harmonia entre as famílias e nas comunidades”.
O texto cita a obra ‘O mercador de Veneza’, de Shakespeare: “A misericórdia não é uma obrigação. Desce do céu como o refrigério da chuva sobre a terra. É uma dupla bênção: abençoa quem a dá e quem a recebe”.
O Papa espera que a misericórdia inspire também a “linguagem da política e da diplomacia”, sobretudo junto dos que têm responsabilidades institucionais, políticas e de formação da opinião pública, para não alimentar as chamas da desconfiança, do medo, do ódio”.
“Como gostaria que o nosso modo de comunicar e também o nosso serviço de pastores na Igreja nunca expressassem o orgulho soberbo do triunfo sobre um inimigo, nem humilhassem aqueles que a mentalidade do mundo considera perdedores e descartáveis”, observa.
A mensagem do Papa é publicada anualmente por ocasião da festa litúrgica de São Francisco de Sales, padroeiro dos jornalistas, que se celebra a 24 de janeiro.
(Agencia Ecclesia).
Mensagem do Papa Francisco para o
50° Dia Mundial das Comunicações Sociais
“Comunicação
e Misericórdia: um encontro fecundo”
Queridos irmãos e irmãs!
O Ano Santo da Misericórdia convida-nos a refletir sobre a
relação entre a comunicação e a misericórdia. Com efeito a Igreja unida a
Cristo, encarnação viva de Deus Misericordioso, é chamada a viver a
misericórdia como traço característico de todo o seu ser e agir. Aquilo que
dizemos e o modo como o dizemos, cada palavra e cada gesto deveria poder
expressar a compaixão, a ternura e o perdão de Deus para todos. O amor, por sua
natureza, é comunicação: leva a abrir-se, não se isolando. E, se o nosso
coração e os nossos gestos forem animados pela caridade, pelo amor divino, a
nossa comunicação será portadora da força de Deus.
Como filhos de Deus, somos chamados a comunicar com todos, sem
exclusão. Particularmente próprio da linguagem e das ações da Igreja é
transmitir misericórdia, para tocar o coração das pessoas e sustentá-las no
caminho rumo à plenitude daquela vida que Jesus Cristo, enviado pelo Pai, veio
trazer a todos. Trata-se de acolher em nós mesmos e irradiar ao nosso redor o
calor materno da Igreja, para que Jesus seja conhecido e amado; aquele calor
que dá substância às palavras da fé e acende, na pregação e no testemunho, a
«centelha» que os vivifica.
A comunicação tem o poder de criar pontes, favorecer o encontro
e a inclusão, enriquecendo assim a sociedade. Como é bom ver pessoas esforçando-se
por escolher cuidadosamente palavras e gestos para superar as incompreensões,
curar a memória ferida e construir paz e harmonia. As palavras podem construir
pontes entre as pessoas, as famílias, os grupos sociais, os povos. E isto
acontece tanto no ambiente físico como no digital. Assim, palavras e ações hão de
ser tais que nos ajudem a sair dos círculos viciosos de condenações e vinganças
que mantêm prisioneiros os indivíduos e as nações, expressando-se através de
mensagens de ódio. Ao contrário, a palavra do cristão visa fazer crescer a
comunhão e, mesmo quando deve com firmeza condenar o mal, procura não romper
jamais o relacionamento e a comunicação.
Por isso, queria convidar todas as pessoas de boa vontade a
redescobrirem o poder que a misericórdia tem de curar as relações dilaceradas e
restaurar a paz e a harmonia entre as famílias e nas comunidades. Todos nós
sabemos como velhas feridas e prolongados ressentimentos podem aprisionar as
pessoas, impedindo-as de comunicar e reconciliar-se. E isto aplica-se também às
relações entre os povos. Em todos estes casos, a misericórdia é capaz de
implementar um novo modo de falar e dialogar, como se exprimiu muito
eloquentemente Shakespeare: «A misericórdia não é uma obrigação. Desce do céu
como o refrigério da chuva sobre a terra. É uma dupla bênção: abençoa quem a dá
e quem a recebe» (“O mercador de Veneza”, Ato IV, Cena I).
É desejável que também a linguagem da política e da diplomacia
se deixe inspirar pela misericórdia, que nunca dá nada por perdido. Faço apelo
sobretudo àqueles que têm responsabilidades institucionais, políticas e de
formação da opinião pública, para que estejam sempre vigilantes sobre o modo
como se exprimem a respeito de quem pensa ou age de forma diferente e ainda de
quem possa ter errado. É fácil ceder à tentação de explorar tais situações e,
assim, alimentar as chamas da desconfiança, do medo, do ódio. Pelo contrário, é
preciso coragem para orientar as pessoas em direção a processos de
reconciliação, mas é precisamente tal audácia positiva e criativa que oferece
verdadeiras soluções para conflitos antigos e a oportunidade de realizar uma
paz duradoura. «Felizes os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia.
(...) Felizes os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus» (Mt 5,
7.9).
Como gostaria que o nosso modo de comunicar e também o nosso
serviço de pastores na Igreja nunca expressassem o orgulho soberbo do triunfo
sobre um inimigo, nem humilhassem aqueles que a mentalidade do mundo considera
perdedores e descartáveis! A misericórdia pode ajudar a mitigar as adversidades
da vida e dar calor a quantos têm conhecido apenas a frieza do julgamento. Seja
o estilo da nossa comunicação capaz de superar a lógica que separa nitidamente
os pecadores dos justos. Podemos e devemos julgar situações de pecado –
violência, corrupção, exploração, etc. –, mas não podemos julgar as pessoas,
porque só Deus pode ler profundamente no coração delas. É nosso dever admoestar
quem erra, denunciando a maldade e a injustiça de certos comportamentos, a fim
de libertar as vítimas e levantar quem caiu. O Evangelho de João lembra-nos que
«a verdade [nos] tornará livres» (Jo 8, 32). Em última análise, esta verdade é
o próprio Cristo, cuja misericórdia repassada de mansidão constitui a medida do
nosso modo de anunciar a verdade e condenar a injustiça. É nosso dever
principal afirmar a verdade com amor (cf. Ef 4, 15). Só palavras pronunciadas
com amor e acompanhadas por mansidão e misericórdia tocam os nossos corações de
pecadores. Palavras e gestos duros ou moralistas correm o risco de alienar
ainda mais aqueles que queríamos levar à conversão e à liberdade, reforçando o
seu sentido de negação e defesa.
Alguns pensam que uma visão da sociedade enraizada na
misericórdia seja injustificadamente idealista ou excessivamente indulgente.
Mas tentemos voltar com o pensamento às nossas primeiras experiências de
relação no seio da família. Os pais amavam-nos e apreciavam-nos mais pelo que
somos do que pelas nossas capacidades e os nossos sucessos. Naturalmente os
pais querem o melhor para os seus filhos, mas o seu amor nunca esteve
condicionado à obtenção dos objetivos. A casa paterna é o lugar onde sempre és
bem-vindo (cf. Lc 15, 11-32). Gostaria de encorajar a todos a pensar a
sociedade humana não como um espaço onde estranhos competem e procuram
prevalecer, mas antes como uma casa ou uma família onde a porta está sempre
aberta e se procura aceitar uns aos outros.
Para isso é fundamental escutar. Comunicar significa partilhar,
e a partilha exige a escuta, o acolhimento. Escutar é muito mais do que ouvir.
Ouvir diz respeito ao âmbito da informação; escutar, ao invés, refere-se ao
âmbito da comunicação e requer a proximidade. A escuta permite-nos assumir a
atitude justa, saindo da tranquila condição de espectadores, usuários,
consumidores. Escutar significa também ser capaz de compartilhar questões e
dúvidas, caminhar lado a lado, libertar-se de qualquer presunção de
omnipotência e colocar, humildemente, as próprias capacidades e dons ao serviço
do bem comum.
Escutar nunca é fácil. Às vezes é mais cômodo fingir-se de
surdo. Escutar significa prestar atenção, ter desejo de compreender, dar valor,
respeitar, guardar a palavra alheia. Na escuta, consuma-se uma espécie de
martírio, um sacrifício de nós mesmos em que se renova o gesto sacro realizado
por Moisés diante da sarça-ardente: descalçar as sandálias na «terra santa» do
encontro com o outro que me fala (cf. Ex 3, 5). Saber escutar é uma graça
imensa, é um dom que é preciso implorar e depois exercitar-se a praticá-lo.
Também e-mails, SMS, redes sociais, chat podem ser formas de
comunicação plenamente humanas. Não é a tecnologia que determina se a
comunicação é autêntica ou não, mas o coração do homem e a sua capacidade de
fazer bom uso dos meios ao seu dispor. As redes sociais são capazes de
favorecer as relações e promover o bem da sociedade, mas podem também levar a
uma maior polarização e divisão entre as pessoas e os grupos. O ambiente
digital é uma praça, um lugar de encontro, onde é possível acariciar ou ferir,
realizar uma discussão proveitosa ou um linchamento moral. Rezo para que o Ano
Jubilar, vivido na misericórdia, «nos torne mais abertos ao diálogo, para
melhor nos conhecermos e compreendermos; elimine todas as formas de fechamento
e desprezo e expulse todas as formas de violência e discriminação» (Misericordiae Vultus, 23). Em rede,
também se constrói uma verdadeira cidadania. O acesso às redes digitais implica
uma responsabilidade pelo outro, que não vemos mas é real, tem a sua dignidade
que deve ser respeitada. A rede pode ser bem utilizada para fazer crescer uma
sociedade sadia e aberta à partilha.
A comunicação, os seus lugares e os seus instrumentos permitiram
um alargamento de horizontes para muitas pessoas. Isto é um dom de Deus, e
também uma grande responsabilidade. Gosto de definir este poder da comunicação
como «proximidade». O encontro entre a comunicação e a misericórdia é fecundo
na medida em que gerar uma proximidade que cuida, conforta, cura, acompanha e
faz festa. Num mundo dividido, fragmentado, polarizado, comunicar com
misericórdia significa contribuir para a boa, livre e solidária proximidade
entre os filhos de Deus e irmãos em humanidade.
Papa Francisco
Vaticano, 24 de
Janeiro de 2016.
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