“Não vos preocupeis com a vossa vida”. Jesus
não está defendendo a preguiça, o comodismo. O que Jesus nos ensina é não se
preocupar, ou seja, a não se ocupar por antecipação, a não empenhar o tempo e
os afetos nos bens deste mundo, esquecendo-se do que é mais fundamental. O que
está em jogo é a troca de valores: a preocupação demasiada com as coisas
(comer, beber, vestir) em troca dos valores do Reino.
Desejamos segurança. É claro que
ninguém vive sem comida, bebida, casa, vestes... É necessário o empenho para
que estes bens sejam garantidos. Mas esta não deve ser a exclusiva ocupação da
nossa vida. Estes bens são concedidos pela providência de Deus, quando somos
capazes de colocar o nosso coração nos bens do Reino. A nossa preocupação
demasiada com as coisas, faz-nos ficar na manutenção da vida. A busca demasiada
pela própria segurança nos imobiliza, diminuindo em nós a capacidade de
arriscar. A confiança em Deus gera o desprendimento, e o desprendimento deixa o
nosso coração livre para servir, para sair de si, para mudar o que nos cerca,
em nome dos valores do Reino.
Parece comum gastarmos muito de nossa
energia remoendo o passado e alimentado a ansiedade diante do futuro. O passado
deve ser memória das bênçãos de Deus e oportunidade para que a misericórdia
inunde o nosso coração, não o elemento fatídico que nos faz deprimir, lamentar
e odiar. O passado não existe mais, portanto, pensemos no que virá. Quanto ao
futuro, este também não existe, ainda está por vir. Portanto, mesmo que demande
o planejamento saudável, não devemos criar demasiada ansiedade, pois tudo está
nas mãos de Deus. É preciso viver o agora. O momento presente é a hora em que o
Senhor está agindo, é a hora do Reino, quando Deus se manifesta. E Deus passa
por nós a cada momento, havendo o risco de que seja despercebido por causa das
nossas ocupações desnecessárias. É preciso colocar tudo nas mãos do Pai: “Vosso
Pai, que está nos céus, sabe que precisais de tudo isso (...)Buscai em primeiro
lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão dadas por
acréscimo. Portanto, não vos preocupeis com o dia de amanhã, pois o dia de
amanhã terá suas preocupações. Para cada dia, bastam seus próprios problemas”
(Mt 6, 32-34).
Portanto, hoje a Palavra de Deus exorta
à confiança. É preciso crer que Deus está conosco, que Ele é o Senhor do tempo
e da história; é preciso reafirmar em nossas consciências, que embora haja
ambiguidades no curso da vida, Deus não se esquece de nós. Por vezes, achamos
que Deus está ausente, que sua ação é ineficaz. Geralmente, tal sentimento nos
assalta quando os problemas são intensos e nossas preces não são atendidas
exatamente do modo como pedimos. Então, o ser humano inclinado a ter Deus como
seu empregado, como alguém que deve fazer os seus caprichos, pensa que Deus
está longe, que não se importa com a história. Foi este o sentimento do povo na
1ª. Leitura: “Disse Sião: ‘O Senhor abandonou-me, o Senhor esqueceu-se de mim’.
Acaso pode a mulher esquecer-se do filho pequeno, a ponto de não ter pena do
fruto de seu ventre? Se ela se esquecer, eu, porém, não me esquecerei de ti”
(Is 49, 14-15). Deus nos ama como uma mãe, não nos esquece, sempre está
conosco. Se não tira nossas dores, concede-nos forças para seguir na sua graça,
no seu amor.
Quando confiamos em Deus, não
precisamos nos preocupar com os julgamentos humanos. São Paulo viveu profundas
perseguições. Certamente, os seus contemporâneos e até membros de suas
comunidades o criticaram por suas atitudes. O apóstolo se defende, dizendo que
é Deus quem o julga. Tenhamos clareza de que a confiança em Deus nos colocará
sob o julgamento injusto das pessoas, e isso acarreta uma certa dor. Aguardemos
o Senhor da julgar a história: “Aguardai que o Senhor venha. Ele iluminará o
que estiver escondido nas trevas e manifestará os projetos dos corações” (1Cor
4,5). As relações humanas são muito baseadas nas aparências... Quais são os
verdadeiros desejos e pensamentos que residem em nosso coração? São os projetos
secretos de nosso coração que nos justificam ou nos condenam. É preciso
fundamentar a vida na reta intenção cheia de amor, com confiança e esperança no
Senhor. “Olhai os pássaros do céu... Olhai os lírios do campo...”
Pe Roberto Nentwig
Arquidiocese de Curitiba-PR
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